Ouvidor diz que ameaças não intimidam nem impedem apuração de chacina no Guarujá

Claudinho Silva virou alvo depois que passou a investigar ação da Polícia Militar no Litoral de SP que deixou 17 vítimas após um soldado ter sido assassinado na região

Reprodução/vídeo

Claudinho Silva tem dois anos de mandato como ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo

O ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo, Claudinho Silva, virou alvo de ameaças de morte depois que começou a investigar o ocorrido na chacina do Guarujá por policiais militares após o assassinato do soldado Patrick dos Reis em 28 de julho. No dia 8, a Secretaria Nacional de Direitos Humanos do PT (Partido dos Trabalhadores) soltou uma nota em sua solidariedade.

Em entrevista, nesta segunda-feira (14), ao Jornal PT Brasil, da TvPT, o ouvidor disse que não se intimidará com os ataques e que é preciso saber em quais circunstâncias se deram as 17 mortes, já que, segundo ele, nenhuma cena de crime foi periciada pela polícia.

O ouvidor citou duas ameaças recebidas. Uma de grupo de WhatsApp de policias penais. “Esse negro maldito, esse ouvidor de Polícia tem que morrer”, relatou Claudinho. A segunda foi a mais ousada. Uma pessoa ligou na Ouvidoria e perguntou qual carro o ouvidor usava, a sua cor, modelo, agendas e se ele era escoltado por policiais civis ou militares. “E simplesmente desliga a ligação e não volta a ligar.” Claudinho afirmou que nos dois casos foram registrados boletins de Ocorrência e que as ameaças não vão interferir em seu trabalho.

Conforme o ouvidor, desde 30 de julho, ele tem recebido informações de ativistas, de organizações de direitos humanos e de moradores da região sobre uma série de arbitrariedades cometidas por PMs desde a morte do policial Patrick na noite do dia 27 de julho no túnel da Vila Julia, em Guarujá, no litoral de São Paulo. Ele já foi duas vezes à região e disse que pretende fazer novas visitas.

Os dados recolhidos pelo ouvidor incluem postagem de policial fazendo brincadeira com o número de mortos nas operações frente à perda da vida de um PM, denúncias de abusos em batidas em residências, inclusive em horário noturno, invadindo a privacidade de mulher durante o banho, relatos de tortura e “casos esquisitos”.

Ele conta que entre as vítimas da ação da PM está um cabeleireiro que, devido a acidente e lesão em tendões, abandonou a profissão porque não conseguia mais segurar a tesoura. Essa mesma pessoa foi acusada de ser morta durante troca de tiros com a polícia portando duas pistolas e muita droga.

“Se ele não segurava a tesoura, como ele seguraria uma arma? Então são respostas que precisam ser dadas”, afirmou Claudinho, complementando que a família da vítima tem toda a documentação do problema em seus tendões.

O ouvidor relata o caso de um usuário de crack entre as vítimas da chacina. Essa pessoa perambulava pela região da Rodoviária do Tietê, em São Paulo, e não tinha nenhuma relação com gente do Guarujá. Como a família monitorava os seus passos, ela sabe que no dia 25 ele fez um saque no banco 24 horas da Rodoviária do Tietê e dia 29 apareceu morto no Guarujá com duas pistolas e uma quantidade enorme de drogas. “Então, são inúmeras respostas que a gente precisa que as autoridades nos deem”, disse Claudinho.

O ouvidor disse que, o mais escabroso, é que todas as cenas de morte não foram periciadas. “Nós não temos uma perícia de cena de crime. Nenhuma perícia com o argumento de que o local era perigoso.”

Segundo Claudinho, um grande desafio é acabar com a violência da polícia contra o povo negro. “O último mapa da violência, apresentado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, aponta que mais de seis mil pessoas morreram por intervenção policial no ano passado. Desse total, algo em torno de 75% das mortes são de pessoas negras. É um dado muito grave, muito relevante que a gente precisa enfrentar”, comentou.

Claudinho tem dois anos de mandato como ouvidor da Polícia de São Paulo e uma longa história de vida na militância do movimento negro e em defesa de direitos humanos. Ele também foi integrante do Conselho de Igualdade Racial e do SOS Racismo da Assembleia Legislativa de São Paulo.

Da Redação

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