Política neoliberal deixa Brasil vulnerável à crise do petróleo, diz Gabrielli

Ex-presidente da Petrobras afirma que, ao abrir mão de refinarias, governo virou refém do mercado internacional

Roberto Parizotti/CUT

A guerra de preços de petróleo entre Rússia e Arábia Saudita pode causar estragos profundos na economia brasileira graças à política de desintegração da Petrobras adotada pelo governo atual, afirma José Sergio Gabrielli, economista e ex-presidente da estatal.

Segundo ele, ao abrir mão da produção em refinarias e focar apenas na importação de petróleo cru do pré-sal, Bolsonaro pôs o Brasil refém do mercado internacional, ao passo em que fez perder autonomia para ajustar preços e controlar estoques – o que, em teoria, traria mais segurança aos investidores e evitaria a queda de quase 30% no valor de mercado da estatal, nesta segunda.

A crise foi motivada por um desentendimento entre Rússia e Arábia Saudita sobre o controle de produção no mercado petrolífero. A divergência fez o preço do barril de petróleo tipo Brent desvalorizar mais de 30%, a maior queda desde a Guerra do Golfo, em 1991.

Gabrielli afirma que as políticas neoliberais lideradas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, agravam os prejuízos com a crise internacional, já que enfraquecem o poder de reação interna do Estado contra movimentações que chegam de fora. De acordo com o economista, as consequências só seriam aliviadas se o governo retomasse a produção nas refinarias – o que, ao menos no discurso do governo, está longe de acontecer.

Ainda conforme o ex-presidente da Petrobras, existe a possibilidade de os preços baixarem para o consumidor de combustíveis, por exemplo. No entanto, a variação dos valores também  é dependente do mercado internacional, neste momento.

Em entrevista ao Brasil de Fato, Gabrielli explicou as consequências da crise e por que o Brasil vai senti-la mais do que deveria.

Brasil de Fato: O que é exatamente a guerra de preços entre Rússia e Arábia Saudita? Em que contexto surgiu?

José Sergio Gabrielli: Houve uma avaliação, por parte do governo da Rússia, de que entre aprofundar as relações com a Arábia Saudita – que vinha em um acordo, desde 2015, segurando o preço do petróleo – e dar um ataque à produção norte-americana, eles resolveram romper com a Arábia Saudita e atacar os Estados Unidos.

Isso é uma resposta geopolítica, ao meu ver, fruto dos avanços das sanções americanas contra os russos, que, entre outras coisas, afetou os interesses da Rosneft [companhia russa de petróleo, uma das maiores do mundo], que está construindo um gasoduto ligando a Rússia à Europa.

O segundo ponto refere-se à Arábia Saudita. A Arábia Saudita tem condições de aumentar a produção e suporta preços mais baixos. Iniciou um movimento de queda dos preços, que derrubou o preço do petróleo em 2014. Naquela época, o que eles queriam também era tirar os Estados Unidos dessa posição de grande produtor de petróleo mundial.

Só que eles pensavam que a resposta americana seria mais rápida, que os Estados Unidos iam reduzir a produção mais rapidamente. Como não foi possível acontecer isso, a Arábia Saudita se aliou à Rússia, em 2015, e elevaram de novo os preços do petróleo.

Os Estados Unidos, de 2008 para cá, saíram de uma situação de importador de petróleo para se tornar o segundo maior produtor de petróleo do mundo. Isso se deu em função de uma intensa utilização de uma técnica chamada fracking [faturamento hidráulico], que permitiu enorme aumento da produção.

É um setor onde predominam empresas médias. Essa indústria só foi possível de prosperar, além das condições de superfície dos Estados Unidos, porque as taxas de juros americanas estavam muito baixas e havia uma liquidez muito grande no mercado internacional de capitais. Então, essas empresas são altamente endividadas.

Com a ação da Rússia, que desmontou o acordo com a Opep [Organização dos Países Exportadores de Petróleo], os preços desabaram. Na medida em que os preços desabaram, como as empresas americanas médias são endividadas, o risco aumentou enormemente, porque o mercado financeiro é o credor dessas empresas e o risco dessas empresas não pagarem aumentou.

Consequentemente, você tem um rebatimento da crise do petróleo no mercado financeiro.

Confira a íntegra da entrevista do Brasil de Fato

 

Por Brasil de Fato

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