Recontratação de demitidos: Sindicalistas criticam portaria de Bolsonaro
Para CUT, portaria presidencial é inconstitucional e joga nas costas dos sindicatos responsabilidade da tragédia para o trabalhador
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O governo federal editou na terça-feira, 14, portaria que autoriza empresas a recontratarem funcionários demitidos durante o período de pandemia do coronavírus, sem que isso configure fraude trabalhista. Essa medida altera a norma em vigor desde 1992, que determina que os trabalhadores demitidos sem justa causa só podem ser readmitidos pelo mesmo empregador após um prazo de três meses.
A recontratação em período inferior a 90 dias pelo mesmo empregador é proibida para evitar uma prática fraudulenta que pode levar à precarização das relações de trabalho, pois em geral isso ocorre para que os patrões possam pagar um salário mais baixo ao readmitir o funcionário demitido.
Apesar de afirmar que o valor do salário tem que ser o mesmo do contrato anterior, o Ministério da Economia também argumenta que a legislação em vigor permite negociação coletiva para redução de salário e, neste caso, a empresa pode recontratar o trabalhador com uma remuneração mais baixa.
De acordo com dados oficiais, entre março e maio de 2020, foram fechadas 1,487 milhão de vagas com carteira de trabalho.
Armadilha
A medida é considerada polêmica e vem sendo duramente criticada por setores do movimento sindical.
O secretário nacional Sindical do PT, Paulo Cayres, o Paulão, reafirma a sua desconfiança com relação ao governo Bolsonaro, principalmente no que diz respeito aos direitos dos trabalhadores.
“Não se pode esperar nada de bom deste governo. À primeira vista pode parecer uma medida positiva por parte do governo, pois trata-se da recontratação de quem foi demitido por causa da pandemia do coronavírus. Mas seria positivo desde que o governo não autorizasse a redução dos salários, o que é ilegal”, afirma ele.
Segundo Paulão, a medida pode ser uma armadilha porque determina que todos os acordos para as recontratações previstas terão que ser feitos através de negociação com os sindicatos.
“Esta é uma forma de engessar os sindicatos, pois neste momento de crise, com mais de 20 milhões de desempregados formais, os trabalhadores demitidos querem retornar aos seus empregos e aí então os patrões vão vir com a velha conversa de flexibilização de direitos, aproveitando do fato de que o trabalhador precisa do seu emprego de volta. E como ficam os sindicatos? Nós podemos até aceitar negociar, mas desde que não haja redução dos direitos dos trabalhadores”, enfatiza.
Decisão absurda
Para o secretário de Assuntos Jurídicos da CUT, Valeir Ertle, esta é a decisão mais absurda que um governo pode tomar, já que a Constituição impede a redução salarial.
O dirigente ressalta que nem a reforma Trabalhista permitiu a demissão e recontratação em seguida por representar fraude, e que a reforma sindical impede que uma pessoa demitida possa retornar a trabalhar na mesma empresa como PJ (pessoa jurídica), antes de um período de ausência de 18 meses.
“A legislação é clara. Não se pode demitir para ganhar menos. Usar a pandemia, um momento de desemprego e o desespero do trabalhador para favorecer patrão não tem fundamental jurídico e é um contrassenso do governo que deveria proteger o trabalhador neste grave momento de crise econômica”, afirma. Nenhum sindicato cutista vai aceitar reduzir salários. Não tem lógica num mundo das relações de trabalho esta decisão. Nenhuma portaria presidencial pode ferir a Constituição. Vamos tomar as medidas jurídicas cabíveis contra este governo que só sabe governar por portaria e decretos inconstitucionais”, afirma.
Aumento da rotatividade
Outro lado negativo da portaria presidencial é que a demissão e posterior recontratação sem esperar os 90 dias que a atual legislação determina vai provocar o aumento da rotatividade dos trabalhadores e a redução de seus ganhos agravando ainda mais a crise econômica.
Na avaliação do técnico do Dieese/Subseção CUT, Leandro Horie, a portaria presidencial é um dos maiores retrocessos no combate a rotatividade dos postos de trabalho Além disso, a redução salarial poderá fazer com que os trabalhadores passem a ganhar somente o piso de suas categorias.
“Na prática, o decreto pode jogar todo mundo para ganhar apenas o piso salarial. Isto é terrível. A média salarial no Brasil é de apenas R$ 2.450,00. Se reduzir ainda mais este valor, vai diminuir drasticamente o consumo das famílias e piorar a crise econômica”, diz Leandro.
Para o técnico do Dieese, a decisão de Bolsonaro é mais uma para não assumir a responsabilidade de financiar a folha de pagamentos neste momento de pandemia.
“ A lógica do governo é fazer o ajuste fiscal nas costas do trabalhador que terá redução sobre as férias, o 13º, tudo proporcionalmente ao valor reduzido do salários. E ainda joga para os sindicatos a responsabilidade de definirem com as empresas se aceitam ou não a redução salarial. É uma forma do governo dizer: ‘não vou me meter, vocês que se entendam’.
Da Redação, com CUT