Vergonha mundial, ministro Ernesto Araújo ‘pede para sair’

Após receber um bombardeio de críticas e atacar a senadora Kátia Abreu, chanceler perde apoio até entre parlamentares bolsonaristas

Orlando Brito

Ernesto Araújo e Jair Bolsonaro

O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, cancelou os compromissos de sua agenda oficial nesta segunda (29) e convocou os secretários da equipe para uma reunião no fim da manhã. Foram chamados os sete secretários do Itamaraty, que têm status de vice-ministros, e o secretário-geral da pasta, embaixador Otávio Brandelli. Após a reunião, ele se dirigiu ao Palácio do Planalto, onde entregou o cargo.

Um grupo de parlamentares iria apresentar ainda nesta segunda ao Supremo Tribunal Federal (STF) o pedido de impeachment de Araújo. Parlamentares da bancada do PSOL no Congresso já haviam pedido abertura de processo à Procuradoria Geral da República (PGR) na sexta (26).

No início desta manhã, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), teria procurado Jair Bolsonaro para pedir a saída de Araújo. Na conversa, disse ao presidente que, se o Executivo não tomasse uma iniciativa sobre o ministro, o Senado tomaria.

Em uma sequência de postagens no Twitter nesta manhã, o senador Jacques Wagner (PT-BA) expressou a tensão em Brasília. “A permanência do atual ministro no comando do Itamaraty é insustentável. Ele joga no lixo a tradição reconhecida da diplomacia brasileira. Prejudica nossas relações políticas e econômicas lá fora, sendo movido exclusivamente por um pensamento atrasado de extrema-direita”, comentou.

“Me solidarizo com senadora Kátia Abreu, vítima da desonestidade e deselegância do ministro. É inadmissível que diante da grave crise que enfrentamos, o responsável por nossa diplomacia incite o conflito no País”, prosseguiu.

Wagner lembrou grandes diplomatas brasileiros do passado, como Oswaldo Aranha, Sérgio Viera de Mello e o Barão do Rio Branco, para ressaltar que o país, que sempre fora respeitado no mundo, tornou-se “saco de pancada”, graças à condução ideologizada das relações internacionais por Araújo.

“O maior comprador de diversos produtos brasileiros é justamente a China e, mesmo assim, eles ficam todo o tempo ofendendo o povo chinês. Querem impor vetos às empresas chinesas na disputa do 5G”, acrescentou o petista. “Se há alguém cometendo alguma improbidade nessa história é justamente o chanceler.”

Escalada do desgaste

Segundo o jornal ‘Folha de São Paulo’, na última segunda-feira (22), Rodrigo Pacheco e o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), se reuniram em São Paulo com grandes empresários, que atacaram Araújo. A relação com China, sempre conflituosa, foi apontada por ele eles, como principal motivo para o Brasil perder um tempo precioso nas negociações por vacinas e insumos para o combate à Covid-19.

Na quarta (24), em reunião da qual participaram Bolsonaro, ministros e chefes de poderes, Lira cobrou do chanceler uma atuação efetiva na busca por vacinas. No mesmo dia, em uma audiência virtual do Senado, diversos senadores o conclamaram a deixar o cargo, por atrapalhar as negociações de insumos e vacinas contra a covid-19.

Na quinta (25), Celso Amorim, ex-ministro de Relações Exteriores que foi considerado “o melhor chanceler do mundo”, também pediu a sua saída. “É o mínimo de dignidade ele sair. O chanceler está sendo criticado por todos, ele é uma unanimidade negativa. Todos desconfiam dele, sejam pela ideologia ou por sua incompetência intelectual”, afirmou em entrevista à ‘Rádio Brasil Atual’. “Não basta ser incompetente, é maléfico. E com a pandemia, o Brasil virou uma bomba atômica de contaminação no mundo.”

No sábado (27), um grupo de mais de 300 diplomatas publicou carta pública acusando a política externa atual de causar “graves prejuízos para as relações internacionais e à imagem do Brasil” e pedindo a saída de Araújo. “A crise da Covid-19 tem revelado que equívocos na política externa trazem prejuízos concretos à população”, afirmou a nota.

Cercado por todos os lados, Araújo atacou a presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Kátia Abreu (PP-TO), no domingo, insinuando em uma postagem que em um almoço no início de março, a senadora o pressionou a fazer algum “gesto” favorável à China nas negociações do sistema 5G. Estaria aí e não nas vacinas, segundo o ministro, o motivo da pressão dos senadores para que ele deixe o governo.

A senadora retrucou, dizendo que ele age de “forma marginal” e “está à margem de qualquer possibilidade de liderar a diplomacia brasileira”. A senadora contou ainda que defendeu que a licitação para a rede de quinta geração não tivesse “vetos ou restrições políticas”. A senadora Simone Tebet (MDB-MS) saiu em defesa da colega. “Ernesto e democracia não andam juntos”, escreveu.

“Um governo responsável pela morte de mais de 311 mil brasileiros, esse chanceler resolve atacar o Senado Federal. Senadora Katia Abreu, receba a minha solidariedade. Este ministro já deveria ter saído. Um irresponsável, desumano e criminoso”, postou o senador Paulo Rocha (PT-PA) no Twitter. Foi seguindo pelo colega de bancada Humberto Costa (PE): “Faz tempo que o chanceler Ernesto Araújo está fazendo hora extra no cargo. Peça para sair, ministro”.

A afirmação do chanceler foi vista como desespero por senadores, uma tentativa de tirar o foco da pressão por sua demissão. Embora ainda contasse com o apoio da ala olavista do governo e dos filhos do presidente, principalmente o deputado Eduardo (PSL-SP) e o senador Flávio (Republicanos-RJ), Araújo já se isolara entre os ministros. Sua queda era vista como questão de tempo. Nos últimos dias, ele próprio acelerou o processo. Não deixará saudades.

Da Redação

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