Cartéis de empreiteiras evidenciam “roubalheira tucana” em SP

Acordos de leniência da Camargo Correa e Odebrecht mostram que corrupção fez parte das grandes obras dos governos do PSDB em São Paulo

Alexandre Carvalho/A2img

Obras do Rodoanel foram objeto de cartelização

Apenas nas obras do Rodoanel, estima-se que o estado de São Paulo tenha perdido entre R$ 7 e 9 bilhões  em um cartel denunciado ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) pela Odebrecht em acordo de leniência. As contas são do deputado estadual José Américo (PT-SP), segundo o qual, “esse Rodoanel, que já foi chamado de rouboanel, hoje fica claro que foi cartelizado”.

Américo explica que “o Rodoanel vai custar de 26 a 30 bilhões de reais quando estiver pronto. É uma rodovia em torno de São Paulo, com 177 quilômetros. Pelo que apareceu no acordo de leniência, mostra que é cartelizado e, quando se fala em cartelização, estamos falando de sobrepreço de 25% a 30%”.

Além do Rodoanel, os documentos entregues ao Cade apontam cartel no Programa de Desenvolvimento do Sistema Viário Estratégico Metropolitano de São Paulo. No total, 22 empresas teriam participado do esquema.

“As empresas apontadas por participar com a Odebrecht junto ao Rodoanel Sul, construíram todos os outros trechos. Não é possível que tenham feito cartel só no trecho sul, a conclusão lógica é que tenham feito em todos os trechos desde 1994”, afirma Américo.

De acordo com o material entregue ao Cade, o esquema operou de 2004 até 2015. Neste período, o estado de São Paulo foi governado pelos tucanos Geraldo Alckmin (2004-06), José Serra (2007-2010) e Alberto Goldman (2010), além de Claudio Lembo, do PFL (2006).

Cartel do Metrô

Outro acordo de leniência, assinado pela Camargo Correa, aponta que também houve cartel nas obras do Metrô em São Paulo. Os casos relatados aconteceram em administrações de Geraldo Alckmin e José Serra.

A Camargo Corrêa afirmou que, durante 16 anos de cartel, pelo menos 21 empresas participaram do esquema. Em 1998, Camargo, Odebrecht e Andrade Gutierrez buscavam dividir entre si grandes projetos de infraestrutura. A partir de 2004, mais duas empresas se somaram a elas, a OAS e a Queiroz Galvão, durante a chamada “consolidação da conduta”, formando o chamado “G-5” ou “Tatu Tênis Clube”.

Segundo a leniência, as empresas do “Tatu Tênis Clube” financiavam em conjunto estudos de viabilidade ou a elaboração do projeto base para obras, como moeda de troca com governos locais, para “obter licitação com termos de qualificação mais restritivos”.

Segundo o deputado João Paulo Rillo (PT-SP), “o povo paulista foi submetido a um verdadeiro auto de fé, obrigado a sofrer por quase uma década até que admitissem o que todo mundo vê e sabe. São obras prorrogadas ad infinitum, com custo que flutua ao longo dos anos, feitas sempre pelos mesmos. É um escracho”.

Rillo destacou que “foram anos não apenas de suspeitas mas, também de ações reais de agentes públicos denunciando e questionando cartéis tucanos em São Paulo. Eu não era deputado nem há seis meses quando protocolei minha primeira representação sobre os consórcios do metrô. Já estou agora no fim do meu segundo mandato”.

Blindagem na justiça

Rillo conta que há quatro anos apresentou outras duas representações ao Ministério Público, pedindo apuração de ato de improbidade por omissão de Geraldo Alckmin e José Serra, em não coibir a ação do cartel de corrupção de trens em SP. “Foram arquivadas. E agora temos uma confissão. Ou seja, fiscalização não faltou. O que faltou, então, ao longo desses anos todos?”, questiona.

“O ponto é que sempre soubemos e é estranho que o Ministério Público estadual nunca saiba de nada. É preciso eles fazerem uma revelação no Cade, no Ministério da Justiça, para que alguma providência seja tomada”, afirmou o deputado estadual Carlos Neder (PT-SP)

“Desde a gestão de Dilma que o Ministro José Eduardo Cardozo vinha dialogando com essas empresas para que elas fizessem no Cade ou no Ministério Público Federal esse tipo de acordo, revelando o que já intuímos em São Paulo. Chama a atenção não haver investigação do Ministério Público estadual, ele não solicitar documentos com a celeridade esperada junto ao Cade e não tomar providências com a agilidade que geralmente toma”, acrescentou.

Neder ainda aponta um motivo grave para a morosidade da justiça paulista nestes casos. “Sabemos que existe relação de subordinação do Ministério Público de São Paulo ao governo de São Paulo, tanto que há um ex-procurador-geral de Justiça assumindo cargo no Governo Alckmin”, afirma, acrescentando que “a Alesp encontra-se dominada a uma maioria subserviente, que não permite investigação mais séria sobre fatos como esses”.

Para Américo, o caso “mostra um escândalo que só em um Estado onde a justiça e o Ministério Público são muito alinhados com o governo não veio a tona mais cedo”. Para ele, a obra do monotrilho ainda deve ser alvo de novas denúncias.

“Talvez seja o mais cartelizado, que mais sinalize a roubalheira tucana. Hoje o quilômetro de monotrilho custa R$ 360 milhões. O Metrô custa R$ 500 milhões o quilômetro, mas carrega três vezes mais gente. É uma aberração o monotrilho e a justiça não ter denunciado o governo e os responsáveis pelos erros de projeto”.

“Vemos um resumo do que chamamos de roubalheira tucana. Que só foi possível entre espécie de conluio entre o estado, as empreiteiras, políticos tucanos e em certo sentido a própria justiça”, acrescenta.

O deputado Américo ainda lembra os casos de cartel envolvendo a Siemens e a Alstom na compra de trens para o Metrô de São Paulo, que acabou empacado na justiça. “Se o caso da Siemens e da Asltom estão parados, apesar do alarde na época, a gente tem que fazer muita pressão para que os acordos da Camargo e da Odebrecht não fiquem impunes”.

“Temos que investigar profundamente as obras desse estado. Se o Ministério Público for a fundo nessa questão, nós podemos encontrar em São Paulo uma situação parecida com do Rio de Janeiro, com a diferença de que em SP tem mais dinheiro, obras muito mais caras, então desvio pode ser maior”, acrescentou.

Imprensa

Até o momento, só foi divulgado que a formação dos consórcios foi feita conforme “sugestão do agente público” e com base na afinidade entre as empresas. Contudo, nenhum meio de comunicação da grande mídia questionou quem pode ser esse agente público.

“Quando há alguma denúncia envolvendo partidos de esquerda e governos progressistas, tratam como fato consumado, dando nomes e siglas. Em situações como essa, procuram caracterizar as origens do governo, incluindo as pessoas que seriam intermediarias nessa negociação de propina. Nesse caso há um agente público, mas qual agente público? Estamos falando do quê? Parentes do governador, membros do primeiro ou segundo escalão do governo Alckmin?”, questiona Neder.

“Hoje está claro que cartéis foram formados, manipularam resultados e preços, beneficiaram grupos e pessoas e não temos garantias que parte desse dinheiro não tenha sido utilizado para financiamento de campanha. O tribunal de contas, a justiça eleitoral, deveriam ser cobrados para pronunciamento rápido, ainda mais sabendo que há tanto tempo esse assunto vem sendo tratado”, acrescentou.

“Pelo que a gente vê, existe um mar de lama em São Paulo, estamos falando do desvio de 5 a 15 bilhões de reais, é muito mais que Rio de Janeiro, maior que Lava Jato, até porque o tempo é muito maior, de [Mário] Covas para cá”, avaliou José Américo.

“Você vê o cuidado do Ministério Público de São Paulo em não envolver o governador. Obvio que não existe cartel sem a participação do governo. No serviço público, se você e omisso é culpado, é incúria. Então eles são incompetentes”, afirmou, acrescentando que “quando Globo fala, é do Metrô, da CPTM, mas não do governo. Só mesmo a inimputabilidade do Alckmin que permite a ele terminar o governo”.

Por Pedro Sibahi, da Agência PT de Notícias

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