Descaso de Bolsonaro pode ter abreviado vida dos próprios eleitores
Falas do presidente sobre pandemia coincidem com quedas nas taxas de isolamento, provocando mais mortes, de modo proporcional, nos municípios com maior votação para Bolsonaro, aponta pesquisa conjunta da Universidade Federal do ABC (UFABC), da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e da Universidade de São Paulo (USP). “É como se, com seu discurso, Bolsonaro tivesse levado seus eleitores ao abatedouro”, explica o doutor em Ciência Política pela USP e professor da UFABC, Ivan Filipe Fernandes, um dos autores do estudo “Ideologia, isolamento e morte: uma análise dos efeitos do bolsonarismo na pandemia de Covid-19”
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Uma nova pesquisa sugere que a irresponsabilidade do presidente Jair Bolsonaro pode ter contribuído para a trágica perda de vidas dos próprios eleitores. O estudo “Ideologia, isolamento e morte: uma análise dos efeitos do bolsonarismo na pandemia de Covid-19” relaciona os momentos, desde o início da pandemia do coronavírus no Brasil, em que o presidente desdenhou dos perigos da doença com o índice de confinamento e óbitos por causa da doença. O resultado é assustador: as falas do presidente coincidem com as quedas nas taxas de isolamento. Por consequência, mais mortes foram registradas, de modo proporcional, nos municípios com maior votação para Bolsonaro.
O levantamento foi conduzido em conjunto por quatro pesquisadores da Universidade Federal do ABC (UFABC), da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e da Universidade de São Paulo (USP). Para apontar a ligação entre as falas e as mortes, os pesquisadores verificaram que a votação de Bolsonaro no primeiro turno, por município, tem uma correlação negativa com a taxa de isolamento. Ao mesmo tempo, apresenta uma correlação positiva com os óbitos por coronavírus. Em outras palavras, nas cidades onde Bolsonaro teve mais votos o isolamento é menor. O número de mortes, por sua vez, aumentou.
“É como se, com seu discurso, Bolsonaro tivesse levado seus eleitores ao abatedouro”, concluiu o doutor em Ciência Política pela USP e professor da UFABC, Ivan Filipe Fernandes, em depoimento ao jornal ‘Folha de S. Paulo’. “Não conseguimos estimar quantas pessoas morreram a mais por conta das falas do presidente, mas certamente teríamos menos óbitos, principalmente entre seus apoiadores, se ele tivesse agido de forma diferente”, observou o pesquisador, um dos autores do estudo.
A reportagem do jornal apresenta gráficos elaborados pelos pesquisadores. Em um deles, são mostrados cinco períodos em que Bolsonaro minimizou o perigo e a letalidade do vírus, apontando as falas e as quedas nas taxas de isolamento verificadas logo depois. Entre as frases do presidente estão “não há motivo para pânico” (5 de março), “outras gripes mataram mais do que essa” (11 de março), “Depois da facada, não vai ser uma gripezinha que vai me derrubar” (25 de março), “Outros vírus mataram muito mais do que esse” (25 de março) e “ninguém vai tolher meu direito de ir e vir” (10 de abril).
Outro gráfico apresenta a queda abrupta do apoio às medidas de isolamento social entre eleitores que se definem como de direita, ocorrida entre março e junho. No período indicado, o índice dos que apoiavam o isolamento despencou de 59% para 41%, ao mesmo tempo em que a taxa dos que discordavam das medidas subiu de 38% para 57%. Os pesquisadores constataram que todas as vezes que Bolsonaro desprezou a pandemia em seus discursos houve queda significativa das taxas de isolamento social em todos os estados, sem exceção.
Os pesquisadores consideraram ainda números de eleitores que votaram em Aécio Neves, em 2014, e José Serra, em 2010, mas não encontraram correlação com as mortes ocorridas por Covid-19.
Da Redação, com informações de ‘Folha de S. Paulo’