Encontro homenageia Chico Mendes nos 30 anos de seu assassinato

“Chico Mendes é reconhecido mundialmente como ambientalista que defendeu a união dos seringueiros e dos povos indígenas”, disse representante da CUT

Divulgação

Encontro Chico Mendes 30 anos

Chico Mendes, que faria 74 anos no sábado (15), foi brutalmente assassinado a tiros de espingarda, no quintal de sua casa, em 22 de dezembro de 1988,em Xapuri, no Acre. O assassino foi Darcy Alves da Silva. O mandante foi o fazendeiro Darly Alves da Silva. Ambos foram condenados, mas já estão soltos.

Após 30 anos de sua morte, o legado do líder sindical e ambientalista, reconhecido em todo o mundo, foi lembrado no Encontro “Chico Mendes 30 anos: Uma Memória a Honrar. Um Legado a Defender”, realizado de 15 a 17 deste mês, em Xapuri, no Acre.

O encontro, promovido pelo Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), reuniu lideranças políticas, sindicais, indígenas, ambientalistas nacionais e internacionais, que defenderam as idéias de Chico Mendes como atuais, especialmente para os povos da floresta, neste momento de retrocessos de direitos.

“Chico Mendes é reconhecido mundialmente como ambientalista que defendeu a união dos seringueiros e dos povos indígenas, mas poucos conhecem o papel que ele teve na construção sindical e do PT. Na época de sua morte ele era presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e muito antes, já havia se reunido com Lula, com quem havia discutido a criação do Partido dos Trabalhadores”, lembra o secretário do Meio ambiente da CUT, Daniel Gaio, que participou da Mesa “Para Além da Floresta: Memória e importância de Chico Mendes para os movimentos sindical e socioambiental no Brasil e no exterior.

Enquanto lideranças destacavam a vida que Chico Mendes dedicou aos povos da floresta e na defesa de uma Amazônia sustentável, quem mais emocionou os presentes foi Lívia Mendes, 9 anos, ao ler a carta que escreveu ao seu bisavô Chico Mendes.

“Meu querido bisavô Chico Mendes, eu gostaria de ter conhecido você. Me contaram sobre você, sobre a sua história e eu sei que você sempre foi importante para o mundo e sempre será. Você salvou a floresta amazônica. Por sua causa, ela é a maior floresta do mundo. Tomara que as pessoas tenham consciência e tenham aprendido que não vivem sem a natureza”, dizia a carta.

Ao final do Encontro, 30 jovens extrativistas fizeram a leitura coletiva da “Carta de Xapuri” – documento histórico que marca o compromisso das pessoas presentes, em especial da juventude da floresta, com a defesa dos ideais de Chico Mendes para os próximos 30 anos.

Angela Mendes, filha de Chico e coordenadora do Comitê Chico Mendes, agradeceu o empenho de todos e todas que participaram da construção do encontro e que acreditam numa sociedade com equidade de gênero, justiça social e ambiental, legado de luta que herdou do pai.

“Conheci meu pai por meio dos amigos, amigas, companheiros e companheiras que lutaram com ele e que consolidaram esse movimento. Quando o assassinaram, eu ainda era muito jovem e nem entendia tudo isso. E é assim, juntos, que mantemos a memória de Chico viva, compartilhado histórias e encabeçando suas lutas e sonhos por um mundo justo. Chico, vive!”, disse Angela, segundo publicou a Agência Acre de notícias.

Confira a Carta Xapuri na Íntegra

“Querido Chico,

Nesta semana, do dia 15 ao dia 17 de dezembro, nós, mais de 500 pessoas de todas as partes do Acre, da  Amazônia, do Brasil e do planeta, nos reunimos na sua cidade de Xapuri-Acre para honrar sua memória e defender seu legado, nos 30 anos de sua ausência física dos espaços deste mundo.

Vivemos momentos de muita saudade e de muita emoção, Chico! Aqui estiveram seus companheiros seringueiros e suas companheiras de empate; de longe, vieram representantes de comunidades extrativistas de todos os  biomas brasileiros; chegaram seus amigos de fora da floresta, do Brasil e do exterior; apareceu gente que conviveu com você, e também muita gente nova, movida pela força de seus ideais.

Durante três dias, refletimos muito sobre o sentido daquela sua  sábia fala que imortalizou a sua visão estratégica sobre o futuro do nosso planeta: “No começo, eu pensei que estava lutando para salvar as seringueiras; depois, pensei que minha luta era para salvar a floresta amazônica; agora, percebo que estou lutando para salvar a humanidade.” Com certeza, Chico! Sua luta foi além… muito além de você mesmo.

Só mesmo você, Chico, para fazer acontecer, nesse tempo amazônico de poucos voos e muitas chuvas, esse nosso diálogo tão profundo, que por inspiração sua, nos faz seguir lutando por um modelo de desenvolvimento sustentável que nos livre das mazelas da depredação ambiental e da contaminação das águas, do solo e do ar que respiramos. Só você mesmo para nos fazer seguir lutando por uma sociedade mais justa, mais solidária e mais igualitária; por esse outro mundo que acreditamos ser ainda possível!

Só mesmo você, Chico,  para nos fazer seguir sonhando ante os retrocessos que se anunciam já nas primeiras decisões de um governo eleito que ainda nem tomou posse e já retira do Brasil o direito de sediar a próxima Conferência do Clima, já declara guerra aos sindicatos, às organizações da sociedade civil, aos movimentos sociais, aos direitos conquistados pela juventude, pelas mulheres, pelos povos indígenas, pelas comunidades quilombolas, ribeirinhas, extrativistas, pelos povos da floresta e por todas as populações tradicionais do Brasil.

E por falar em juventude Chico, você deve estar feliz com a decisão que seus companheiros e companheiras do CNS tomaram de fazer deste Encontro um momento de compartilhar conhecimento e de transferência geracional. Assim como você sonhou um dia, mais da metade das pessoas que aqui estão são jovens. São jovens que vieram para firmar compromisso com a defesa do seu legado para os próximos 30 anos!

Infelizmente “a lembrança de um triste passado de dor, sofrimento e morte”, registrada por você em sua mensagem aos jovens do futuro, datada para  6 de setembro de 2120, é ainda tristeza constante em nossos dias. Os números são alarmantes, companheiro Chico: a cada cinco dias uma companheira ou um companheiro seu, e nosso, é assassinado no Brasil.

Somente no ano de 2017, foram registrados mais de mil conflitos por terra, água ou trabalho nos campos e nas florestas do nosso país. Nos últimos 12 meses, foram ao menos 70 mortes. A última delas foi a do companheiro Gilson Maria Temponi, em Placas, no Pará. Imagina Chico, mais uma morte quando já estávamos aqui reunidos para honrar sua memória, nos 30 anos do seu assassinato, na porta dos fundos de sua casa, no dia 22 de dezembro de 1988, pelas balas traiçoeiras de uma espingarda disparada a mando do latifúndio.

Mas nem tudo é tristeza! Com grande alegria, aqui celebramos o seu legado. A luta de seus companheiros e companheiras transformou as Reservas Extrativistas! Aquela proposta de uso comum e coletivo das áreas de floresta pelas populações extrativistas que você apresentou no I Encontro Nacional dos Seringueiros, realizado em 1985, em Brasília, cresceu, tornou-se política pública, não só na Amazônia, mas também nos outros biomas brasileiros.

Hoje são milhares de famílias, vivendo em milhões de hectares de áreas protegidas. E  nessas áreas, ainda que falte muito, além da produção extrativista, já existe escola, posto de saúde, luz elétrica, e em muitos casos até internet! Só que agora, companheiro Chico, os novos governos e o parlamento eleitos ameaçam entregar as terras sob nossa guarda, que garantem a sustentabilidade da nossa economia e do nosso modo de vida ao agronegócio, às madeireiras e à mineração.  Esquecem que os serviços ambientais que prestamos beneficiam não só a nós, mas a todos os povos do mundo.

Tomara, companheiro Chico, que as conquistas desse seu legado, resultado da nossa resistência nessas últimas três décadas, das alianças que você tão generosamente construiu com os mais variados parceiros da floresta e de fora dela, sensibilizem os corações e mentes de quem está chegando ao poder para continuar respeitando e trabalhando junto aos nossos povos da floresta, em defesa de nossos territórios, da conservação ambiental e dos direitos sociais do povo brasileiro.

Oxalá, companheiro Chico, aqui mesmo, nas barrancas do Rio Acre, nessa sua amada terra de Xapuri, no coração da floresta amazônica, a juventude do ano 2120 possa estar reunida numa auspiciosa Semana Chico Mendes, para celebrar a força da luta que carregamos juntos com nosso povo, das matas, do sertão, do mar,  dos rios e das florestas; para comemorar a união de todos povos em torno dos ideais que você nos legou e da revolução planetária que a medida do tempo não te permitiu viver, mas que você teve o prazer de ter sonhado.

Ninguém abandona a defesa dos povos da floresta!

Ninguém desiste do legado de chico mendes!

Ninguém solta a mão de ninguém!”

Da CUT, com informações da Agência Acre de Notícias

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