Especialistas: povo vai pagar a conta da privatização da Eletrobras

Técnicos do setor de energia projetam explosão tarifária para 2023. Conta pode subir até 25%, estima Dieese. “É o neoliberalismo em estado puro, nada de bom pro consumidor”, denuncia Gleisi Hoffmann

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Entreguismo: Privatização da Eletrobras é feita sem nenhum estudo sério que justifique a operação

Enquanto o toque de campainha da privatização da Eletrobras ocorria na Bolsa de Valores de São Paulo, nesta terça-feira (14), movimentos sociais e sindicais promoviam, a alguns metros da Bovespa, ato público denunciando os prejuízos da operação. Entre eles, a explosão das tarifas “contratada” para 2023. Ao contrário do prometido pelo desgoverno Bolsonaro, o povo pagará, literalmente, a conta do entreguismo.

Concretizada a venda, o Estado perde o controle acionário da empresa, que estava na casa de 62%, reduzindo sua participação para menos de 40%. A “tática nefasta”, como qualificou a presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann, foi atacada pela coordenadora do Coletivo Nacional dos Trabalhadores Eletricitários (CNE), Fabiola Latino.

“A Eletrobras é a maior empresa de geração e transmissão da América Latina, é início da cadeia produtiva do Brasil”, alertou a dirigente no ato. “O aumento refletirá na cadeia industrial produtiva, vai acabar com o pouco desenvolvimento que estamos tendo hoje.”

Diretor da Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras (Aesel), Ikaro Chaves lembrou que a categoria e os movimentos tentam impedir a privatização da Eletrobras desde que o ilegítimo Michel Temer anunciou a intenção, em 2017. Mas a “truculência” do desgoverno Bolsonaro “atropelou as próprias promessas de campanha e a maioria da população brasileira que é contra a venda da empresa”.

Acesse estudo da Associação dos Empregados da Eletrobras.

“A partir de agora nossa luta é pela reestatização da Eletrobras”, destacou o engenheiro da Eletrobras. “O Brasil não pode conviver sem uma empresa pública no setor mais importante, que é o da infraestrutura, do Brasil e de qualquer país do mundo.”

Em entrevista à Rádio Vitoriosa, de Uberlândia (MG), Luiz Inácio Lula da Silva voltou a condenar o entreguismo. “Agora resolve privatizar a Eletrobras, dizendo que vai ter mais emprego e que vai baratear. Não vai baratear! A hora em que privatizar a Eletrobras não vai ter mais Luz para Todos, porque não tem empresário socialista nesse país que está disposto a fazer ligação de graça na casa das pessoas. Nós fizemos”, criticou.

No Twitter, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) chamou a atenção para as falsas argumentações do desgoverno Bolsonaro. “Especialistas do setor de energia vem confirmando o que a gente vem dizendo faz tempo, a privatização da Eletrobras não irá reduzir a conta de luz e a venda da estatal não tem esse objetivo. É o neoliberalismo em estado puro, nada de bom pro consumidor.”

Uol gritou “pega ladrão” depois do assalto

A presidenta nacional do PT fez menção à reportagem publicada nesta terça no portal Uol, com vários especialistas anunciando a explosão tarifária. Após passar dias instigando trabalhadores a usarem recursos do FGTS para comprar ações da Eletrobras, o portal resolveu denunciar o crime contra a economia popular depois de perpetrado.

“O argumento mais fácil para poder, digamos, atingir os incautos é justamente dizer que vai baixar a tarifa de energia elétrica. É uma retórica que aparece sempre. Mas, desculpe-me quem acredita na fantasia de que as tarifas serão reduzidas. Isso é desprovido de qualquer base”, ironizou no portal Celio Bermann, professor associado do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE-USP). “As tarifas vão ficar mais caras, e o serviço prestado vai ser mais precário”, previu o acadêmico.

“Isso não tem qualquer lógica. O que levaria à redução das contas? A Eletrobras nem define as tarifas de energia. Quem cobra a energia elétrica da população são as empresas de distribuição locais, e a maioria já são privadas”, acrescenta o professor Ewaldo Mehl, do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

“A privatização não tem como objetivo principal a redução de tarifas. Ela tem o objetivo de mudar a governança da Eletrobras e retomar sua capacidade de investimento. Esse é o objetivo de longo prazo”, arremata Edmar Almeida, do Instituto de Energia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) Rio. “O preço vai depender do mercado. Espera-se que esse mercado, com maior concorrência, gere preços mais baixos. Mas não é algo que o governo possa garantir.”

Conforme o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a Eletrobras alcançou investimentos em torno de R$ 200 bi entre 2000 e 2021. Nota técnica do órgão sindical estima que a privatização poderá levar a aumentos de até 25% na conta de luz, tanto para as residências familiares quanto para os grandes consumidores do comércio e indústria.

Acesse a Nota Técnica do Dieese.

Gilberto Cervinski, da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), afirmou ao jornalista Pedro Carrano que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) previa aumento médio de 20% na conta de luz em 2022, mas o suspendeu e o postergou para 2023. Em ano eleitoral, Bolsonaro usará parte do dinheiro da privatização da Eletrobras para compensar o adiamento e deixar uma “bomba tarifária” para a próxima gestão.

“A situação atual é de ingovernabilidade que criaram no setor elétrico. Anteciparam o que deveria ser feito no futuro e já está planejado um grande tarifaço na conta de luz posterior à eleição”, afirma Cervinski.

“Imagine aumentar a conta de luz, numa economia em recessão, o custo de produção. O que significa para pequenas e médias empresas é a falência na economia e demissão de mais pessoas”, aponta o dirigente. “A questão de fundo é a crise profunda instalada, uma bolha elétrica prestes a explodir”, aponta.

Novos contratos de concessão abrem portas para a lei da selva

Ao mesmo tempo em que avançava a privatização da Eletrobras, a empresa e o desgoverno Bolsonaro já tratavam da assinatura de novos contratos de concessão de 22 usinas hidrelétricas. Formalizados os novos acordos, essas usinas passarão a poder vender energia a preços de mercado, no Ambiente de Comercialização Livre (ACL).

Conforme definiu o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), o valor adicionado pelas novas concessões envolve R$ 67 bilhões. Desse total, R$ 25,3 bilhões serão pagos à União, em uma única parcela, a título de bonificação pela outorga dos novos contratos, com prazo de 30 anos.

Nos novos contratos, boa parte das hidrelétricas sairá do atual regime de cotas, que garantia a modicidade dos preços ao consumidor, e passará ao regime de produção independente, dando à companhia liberdade de comercialização. A migração se dará de forma gradual, ao ritmo de 20% por ano, com início em 1º de janeiro de 2023.

Essa descotização das usinas refletirá nas tarifas de energia, uma vez que o valor do megawatt/hora atualmente alocado para a distribuidora na forma de cota, a um custo baixo, passará a ter valor de mercado. A economista Clarice Ferraz, diretora do Instituto Ilumina, ressalta que a dimensão desses aumentos ainda é desconhecida.

“É aqui que tem o maior risco de explosão tarifária. A distribuidora vai perder esses contratos (cotizados) e vai ter que buscar no mercado”, disse Ferraz ao portal Nexo. “Não sabemos a que preço isso vai ser.”

Presidente da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE), Murilo Pinheiro afirmou em nota que o fim do controle pelo Estado da maior empresa energética do país é “um inacreditável tropeço estratégico para o desenvolvimento e a soberania nacionais”. No texto, Pinheiro afirma que a privatização “trará aumento de tarifas e desorganização no setor energético, além de comprometer o desenvolvimento nacional”.

“Na ânsia de cumprir agenda neoliberal superada ao redor do mundo, vende-se patrimônio público estratégico por cerca de R$ 30 bilhões – valor inferior ao orçamento secreto”, ressaltou Pinheiro. Com isso, diz o engenheiro, “mina-se o esforço de planejamento energético do país e descumprem-se leis.”

“A decisão de abrir mão da empresa responsável por 40% da transmissão de energia, 30% da geração, detentora de várias usinas hidrelétricas e tendo a seu cargo a gestão de grande parcela do armazenamento de água utilizada no setor é um equívoco que cobrará seu preço no curto, médio e longo prazos”, afirmou ainda o dirigente. “Uma bomba para aumentar ainda mais o custo de vida está prestes a explodir.”

Da Redação

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