Laisy Morière: Tomemos de volta nossas bandeiras! (2)

Este 8 de março deve ser marcado como propulsor da retomada das ruas para evitar que 2017 seja o marco de um retrocesso histórico

Emmanuela Cristina Leite Nunes

Em março do ano passado publicamos o artigo “Tomemos de volta nossas bandeiras”. Falávamos das inegáveis conquistas alcançadas até então pela luta das mulheres, apesar do árduo e contínuo embate que sempre teremos pela frente no que tange a alçarmos uma sociedade paritária, mas já chamávamos a atenção para o avanço de forças conservadoras no cenário político brasileiro e o consequente retrocesso que isso poderia acarretar.

Alertávamos: O agir da luta das mulheres que antes estava focado na busca de novas conquistas, agora se orienta, também, pela tensão de ter que ir adiante, mas sempre em alerta para assegurar que direitos já incorporados não sejam sorrateiramente cassados, como ocorreu recentemente com a  aprovação da lei que dificulta o aborto nos casos já previstos na legislação brasileira, inclusive quando a gravidez é fruto de estupro. (… )

Setores progressistas têm assistido a uma nova onda conservadora influindo nos rumos do país. Setores da direita têm infligido várias derrotas ao Governo, aos trabalhadores e trabalhadoras, à parte significativa da sociedade que foi apartada das políticas governamentais por séculos e, de forma particular, às mulheres. Neste caso, tanto com ações efetivamente direcionadas a elas no intuito não só de barrar, mas de retroagir nos avanços rumo à conquista de sua autonomia, no sentindo mais amplo, como com a tentativa de enfraquecê-las ao tentar fragilizar o símbolo maior dessas conquistas neste momento: a presidenta Dilma. Ao tentarem inviabilizar seu Governo, o fazem também com o intuito de fazer retroceder toda a luta das mulheres. Ao tentarem fazer acreditar que ela não é capaz de gerir, o fazem com o intuito de propagar, para a sociedade, uma falsa ideia de que é a mulher que não é capaz, reforçando os velhos padrões de uma sociedade machista, e bem viva, que define a casa, os afazeres domésticos como atribuições da mulher.

Um ano depois, o cenário é devastador se consideradas todos as perdas homologadas: golpearam, por conveniência, sem qualquer tipo de pudor, a Presidenta democraticamente eleita por milhões de cidadãos e cidadãs brasileiras; fizeram ascender um governo golpista, machista, compromissado não só com a ruptura de um processo de desenvolvimento e inclusão dos setores da sociedade historicamente ignorados pelo Estado, mas, principalmente, com o reestabelecimento de uma cultura governista que privilegia a elite e aqueles que orbitam no seu entorno; para completar a ação, alvejaram o PT e descarregam nele todo seu potencial bélico com a ilusão de que podem destruir de vez a esperança que se fez germinar e mostrou que é possível sim  avançar em direção a uma sociedade mais justa e igualitária.

Agora, tomado o poder, abalada a esperança, tentam consolidar seus projetos elitistas mirando em conquistas históricas da classe trabalhadora que, como tudo que retrocede, atinge primeiramente as mulheres como já nos alertava  Simone de Beauvoir: Nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilante durante toda a sua vida”

A proposta em curso no Congresso Nacional de reforma da Previdência atinge em cheio  as trabalhadoras e trabalhadores de nosso País e poupa, por exemplo, as grandes fortunas e os afortunados que ocupam assentos em lugares públicos nos quais deveriam estar para defender os interesses da sociedade como um todo mas, em grande parte, são absorvidos pelo corporativismo e as facilidades que o exercício do mandato ou do cargo lhes garante, a exemplo do direito que um senador tem de se aposentar com salário integral ou ter plano de saúde vitalício para si e seus familiares  após exercer o mandato por tão somente 180 dias. A reforma proposta prevê, além de outros sérios prejuízos para quem vive de sua força de trabalho, igualar a idade para que  homens e mulheres acessem o direito de se aposentar. Os atuais 65 anos para homens seriam mantidos, mas passariam a vigorar também para as mulheres, incluindo as rurais e professoras (es) da educação básica. Além disso, para se ter direito a receber o  equivalente a 100 por cento do valor do benefício será preciso que a pessoa contribua por 46 anos.

Ao contrário do que mostra a propaganda governamental, há vários artigos, manifestos, vídeos explicativos circulando nas redes sociais sobre as verdades e mentiras por trás da proposta, os danos e consequências que a sua aprovação, tal como apresentada pelo Sr. Michel Temer, acarretarão sobre a classe trabalhadora, punindo, ainda mais, as mulheres.

Querem igualar a idade para que homens e mulheres tenham acesso ao benefício da aposentadoria, mas não discutem nenhum tipo de iniciativa que assegurem a conquista da igualdade em qualquer outro âmbito  da vida, seja na política onde o poder ainda é severamente masculino e as artimanhas garantem o infringir de regras que almejam garantir um percentual mínimo para que as mulheres possam se fazer representadas; seja no ambiente profissional onde  a isonomia salarial entre mulheres e homens que desenvolvem as mesmas funções persiste como bandeira de luta; seja na construção de instrumentos que possam romper com a cultura de que os afazeres e os cuidados domésticos são atribuições genuínas do gênero feminino. Ignoram as múltiplas jornadas de trabalho que nos são imputadas, fazem ecoar o discurso da igualdade quando lhes é conveniente e silenciam-se quando vislumbram que seu status quo pode ser ameaçado.

Se em épocas passadas íamos para as ruas celebrar o Dia Internacional da Mulher empunhando nossas bandeiras e ampliando nossas pautas, neste 8 de março o desafio é ainda mais desafiador, particularmente para nós mulheres brasileiras. Ele deve ser marcado como propulsor da retomada das ruas para denunciar, ocupar, mobilizar, agregar forças e apoios com o intuito de evitar que 2017 seja o  marco de um retrocesso histórico. Se permitirmos este recuo, o caminho estará pavimentado para que outros ocorram. Tomemos de volta nossas bandeiras empunhando-as o tempo necessário para evitarmos qualquer retrocesso nos direitos arduamente conquistados e sigamos em frente até construirmos uma sociedade em que as diferenças sejam somente pressuposto para tratarmos a pessoa com o devido respeito.

Laisy Moriere é Secretária Nacional de Mulheres do PT

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