Legislativo abraça clamor punitivo da sociedade, diz Damous

A fim de efetivar princípios constitucionais e mostrar que cadeia não resolve tudo, deputado apresenta 11 projetos civilizatórios ao sistema criminal

Paulo Pinto/Agência PT

Deputado federal e jurista Wadih Damous (PT-RJ) quer combater cultura do encarceramento em massa

Munido da crença de que é também papel do Poder Legislativo pensar e propor melhorias ao sistema criminal brasileiro, o deputado federal e jurista Wadih Damous (PT-RJ) apresentou onze projetos de lei que visam efetivar princípios constitucionais e resgatar um patamar mínimo civilizatório para a justiça criminal.

“Com minha vivência aqui nesse ano e meio na Câmara, como deputado de primeiro mandato, assisto diariamente a um processo de retroalimentação do sentimento e do clamor punitivo que existe na sociedade”, afirma o petista, que leva também em conta em sua avaliação o fato de o país ocupar a quarta posição no ranking de países com maior número de encarcerados do mundo.

Esse clima social surge, pondera, a partir da ideia de que o direito penal resolve os problemas e os conflitos sociais. Trata-se de uma forma de pensar punitivista que, segundo o parlamentar, é em parte construído por programas policialescos de rádio e televisão.

“A grande imprensa é punitivista. E esses programas sensacionalistas, sempre nessa linha de dizer que há impunidade no Brasil, ajudam a criar no imaginário das pessoas a noção de que a salvação está em colocar todo mundo na cadeia”, justifica.

O Congresso Nacional, afirma Damous, absorve esse clamor e o transforma em leis, o que gera um verdadeiro cerco à Constituição Federal, “um abrigo de direitos e garantias fundamentais importantíssimos”.

Deputado federal Wadih Damous (PT-RJ)

“Em um sistema como o nosso de hierarquização das leis, em que a Constituição é a lei maior, interpretam-se as leis à luz da Constituição. Porém, agora, o que está acontecendo é o contrário: se está interpretando a Constituição a partir das leis de hierarquia inferior. Maior exemplo disso é a decisão do Supremo Tribunal Federal relativizando o princípio da presunção de inocência”, declara Damous.

O clamor punitivista, somado à realidade do sistema carcerário brasileiro, recentemente explicitada com as chacinas do início do ano, fez Damous perceber que era hora de remar contra a corrente hegemônica que prega o encarceramento a todo custo e colocar no debate o desencarceramento como forma de apaziguar conflitos sociais.

“Aquelas pessoas que não oferecem riscos à vida humana, riscos à integridade física, riscos iminente à sociedade, não têm que estar presas. Elas podem ter restrição de direitos e não restrição de liberdade. Cadeia é só para aqueles que podem atentar contra a vida humana, que cometem violência, gente que pode ser perigosa para a convivência, para a vida em sociedade. Não tem cabimento você colocar uma pessoa na cadeia por furto. Furto é se apropriar de bem alheio sem violência”, justifica.

Os números corroboram o que diz Damous. Cerca de 40% dos encarcerados no Brasil são presos provisórios, ou seja, que ainda não foram condenados, segundo dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias de 2014. Há ainda uma grande parcela que cometeu crimes de menor potencial ofensivo, sem risco à vida ou à integridade física.

Damous faz questão de ressaltar que seus onze projetos não visam a impunidade: “Muito pelo contrário. Não é nenhum culto à impunidade. Punir não é só prender. Pode haver diversos tipos de punições que não necessariamente a prisão”.

Para ele, seus projetos visam contribuir para criar uma nova cultura que pregue que punir tão só e simplesmente não resolve. “E que a violência é decorrente, sobretudo, de fatores de profunda desigualdade social.  Um ambiente mais estável, em que não haja tanta instabilidade, reduziria o índice de violência”, pondera.

Damous acrescenta que é preciso criar condições de vida em sociedade com menos violência, preconceito e intolerância, pois o Brasil caminha hoje para o que considera ser um modelo fascista de sociedade.

“Estamos chamando (esses projetos) de onze medidas civilizatórias porque consideramos que está se confirmando no processo legislativo brasileiro, no ordenamento jurídico, um processo de barbárie, de fascistização, que tem como foco o sistema de justiça criminal”, explica o parlamentar.

Os legisladores absorvem clamor punitivo da sociedade e o devolvem em forma de lei

Os onze projetos do deputado Damous são divididos em quatro eixos fundamentais: Mulheres, Política de Drogas, Racionalização do sistema e sobre Execução de penas e prisão preventiva.

O primeiro eixo tem um projeto específico voltado às mulheres encarceradas e busca conferir um mínimo de dignidade em razão da maternidade.

A proposta torna possível a suspensão condicional da pena em razão da maternidade. Ou seja, a execução da pena privativa de liberdade, desde que não superior a quatro anos, poderá ser suspensa pelo mesmo tempo da pena imposta, acrescida de um terço, quando a condenada estiver gestante, lactante ou for mãe de criança de até seis anos ou com deficiência.

Caso uma mulher nessas condições seja condenada, por exemplo, a dois anos de prisão, sua pena poderá ser suspensa e depois de dois anos ela poderá voltar a cumprir a pena. O que significa que a condenada não deixa de cumprir sua sentença, seu cumprimento é apenas adiado.

“Isso é para humanizar. E aquele velho preceito que a nossa Constituição absorveu, que a pena não pode passar da pessoa condenada. Vai querer que o bebê nasça no presídio? Já nasça em um ambiente hostil, de barbárie, que são as nossas penitenciárias?”, questiona Damous.

Outro eixo ataca uma das inconsistências da Lei de Drogas na aplicação relativa à precariedade de provas nas condenações. E estabelece que serão nulas as sentenças condenatórias que, na fundamentação, basearem-se exclusivamente no depoimento de policiais.

“O que acontece tradicionalmente é que a palavra do policial goza de presunção de verdade. Ou seja, quem for acusado de traficar tem que provar que o policial está mentindo. Inverte-se o ônus da prova”, denuncia.

Seu projeto afirma que apenas a palavra do policial não bastará para a condenação de pessoas acusadas de tráfico. Ela deverá vir acompanhada de um mínimo de indícios veementes que confirmem aquilo que ele está dizendo.

Nos dois últimos eixos, há propostas que buscam tornar o sistema de justiça criminal mais eficiente, resguardando e reforçando direitos e garantias individuais, e outras que se relacionam à execução da pena e prisão preventiva, ressaltando que há outras formas de punição que não apenas o encarceramento.

Por Luana Spinillo, da Agência PT de Notícias

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