Lô Borges, gênio que embalou os sonhos do Brasil, por Reginaldo Lopes

A chama criativa do músico continua acesa, iluminando a paisagem na janela da cultura brasileira

Flávio Charchar/divulgação

Lô Borges nasceu em 10 de janeiro de 1952

Belo Horizonte, Minas Gerais e todo o Brasil acordaram mais silenciosos e tristes nesta segunda-feira, dia 3 de novembro, com a notícia da partida de Salomão Borges Filho, o eterno e querido Lô Borges. Sua morte deixa um vazio irreparável na música brasileira, mas seu legado – um vasto e inestimável repertório musical – segue para sempre embalando os sonhos de sucessivas gerações.

Ele foi uma das colunas centrais do revolucionário Clube da Esquina, o coletivo de artistas mineiros que transformou profundamente a música popular brasileira. Ao fundir influências de jazz, samba, rock, psicodelia – e nas indeléveis raízes mineiras –, o grupo forjou um som único, experimental e profundamente poético.

O ponto alto dessa revolução foi o álbum duplo “Clube da Esquina” (1972), lançado em parceria com Milton Nascimento quando Lô tinha apenas 20 anos. Foi, e continua sendo, um dos marcos mais importantes da discografia mundial, eleito por críticos estrangeiros como um dos melhores de todos os tempos.

Nascido em janeiro de 1952, Lô era o sexto dos 11 filhos do ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais Salomão Borges e da professora Maria Fragoso, a dona Maricota. Foi em sua casa, no bairro Santa Tereza, que a história do Clube da Esquina começou a ser escrita. O local de encontro do grupo, no cruzamento das ruas Divinópolis e Paraisópolis, foi batizado pela própria dona Maricota de “Clube da Esquina”.

Foi justamente ali que jovens como Milton Nascimento, Beto Guedes, Toninho Horta e os irmãos Marilton, Márcio, Yé, Telo e Lô Borges construíram uma nova linguagem musical brasileira. Milton, ou Bituca, um dos grandes nomes da música mundial, foi acolhido pela família Borges ao chegar a Belo Horizonte, no começo dos anos 1960. E logo presenteou Lô, então com 13 ou 14 anos, com seu primeiro violão. Foi o princípio de uma carreira de grande compositor, arranjador e harmonizador.

Essa sintonia rendeu frutos precoces: antes mesmo do álbum de 1972, o disco “Milton” (1970) já trazia clássicos como “Para Lennon e McCartney” e a primeira canção batizada de “Clube da Esquina”.

Do legendário álbum de 1972, saíram obras de arte criadas por Lô Borges que se tornaram hinos atemporais, como “Paisagem na Janela”, “O Trem Azul”, “Um Girassol da Cor de Seu Cabelo” e “Aos Barões”. Sua carreira solo também brilhou. Em 1972, lançou o aclamado “Lô Borges”, popularmente conhecido como “O Disco do Tênis” devido à capa. Submergiu por uns tempos a partir daí e retornou em outra gravação magistral, o “Clube da Esquina 2”, de 1978.

Além de toda essa sua genialidade musical, Lô era um torcedor declarado do Cruzeiro, e sua música “Trem Azul” foi adotada pela torcida celeste, embora o compositor Ronaldo Bastos tenha esclarecido que a canção não fora escrita com essa intenção.

A dor de sua perda foi resumida por Milton Nascimento em uma nota emocionada, em que lembra que “foram décadas e mais décadas de uma amizade e cumplicidade lindas… Lô nos deixará um vazio e uma saudade enormes, e o Brasil perde um de seus artistas mais geniais, inventivos e únicos”.

Lô Borges deixa uma obra que, como dizem os versos imortais de “Clube da Esquina Nº 2” – de autoria dele, de Milton e de Márcio Borges –, permanece jovem para sempre. “Porque se chamavam homens, também se chamavam sonhos, e sonhos não envelhecem”. O gênio mineiro se foi, mas sua chama criativa continua acesa, iluminando a paisagem na janela da cultura brasileira.

* Reginaldo Lopes é deputado federal pelo PT

*Artigo publicado originalmente no site do jornal O Tempo

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