Nascer, crescer e sobreviver LGBT: como a violência marca toda uma existência

Os dados refletem uma realidade que percorre toda a vida e ceifa futuro da população LGBT

Da Redação, Agência Todas, e Secretaria Nacional LGBT do PT

 

Nascer LGBT

Não importa a idade que se ‘saia do armário’ ou ‘se descubra’ LGBT, independente da identidade ou orientação sexual, a população LGBT já nasce em um país totalmente hostil à sua própria existência. O Brasil é um dos países que mais mata homossexuais, travestis e transexuais no mundo. 

Se a mulher é lésbica, o quadro é ainda mais complexo. A invisibilidade dessas mulheres pelo poder público gera um quadro ainda pior de subnotificação de casos, porque não há dados oficiais — os registros, no geral, são coletados na mídia e em redes sociais. Em 2014, foram registradas 16 mortes de lésbicas. Em 2017, o número passou para 54 – um aumento de 150% de casos em quatro anos. Só nos dois primeiros meses de 2018, já foram registradas 26 mortes por lesbocídio. Esses números foram sistematizados no Dossiê Sobre Lesbocídio, do Núcleo de Inclusão Social da UFRJ. 

Para quem nasce em cidades do interior, em qualquer região do país, a situação também se agrava: a mulher lésbica tem o dobro de chances de ser assassinada nas províncias. 

São Paulo é o estado que concentra o maior número de assassinatos e suicídios de lésbicas, representando 20% dos registros dos últimos quatro anos de acordo com os registros. Consequentemente, a região sudeste é que possui mais casos entre 2014 e 2017. 

 

Crescer LGBT

Os indícios de violência começam bem cedo, na escola, quando adolescentes LGBT sofrem agressões verbais e físicas e não encontram apoio dos professores e até mesmo da família. Em 2013, o MEC constatou que 20% dos alunos não querem um colega gay ou trans. Outro estudo da UFSC revelou que 32% dos LGBTs entrevistados afirmaram sofrer preconceito na sala de aula por causa de sua orientação sexual.

A depender do estudo, os números variam, mas a constatação é a mesma: hostilidade, preconceito e bullying na escola moldam a sociabilidade dos LGBT em um momento importante da vida — enquanto estão se desenvolvendo enquanto pessoa e descobrindo o próprio sentido de ser e estar no mundo. Um processo natural da idade, independente da identidade ou orientação sexual, mas que, para os LGBTs, é atravessado por um cenário de violência, agressão e crueldade. 

No caso das lésbicas, as jovens de 20 a 24 anos são as maiores vítimas de lesbocídio. 55% dos casos acontecem em não-feminilizadas, ou seja, que não aparentam o ideal de feminilidade que a sociedade impõe às mulheres; e 83% são mortas por homens. Só que, diferentemente dos casos de feminicídio, por exemplo, em que mulheres são mortas por homens próximos ou conhecidos (namorado, marido, ex, pai, irmão), as lésbicas são atacadas por desconhecidos — homens que as abordam na rua e as espancam até morrer. 

A pesquisa da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) entrevistou alunos LGBT revelou que 27% dos alunos LGBT entrevistados afirmaram ter sofrido agressão na escola e 73% foram xingados por conta de sua orientação sexual. Além disso, 68% foram agredidos verbalmente no ambiente escolar devido à identidade ou expressão de gênero, e 25% foram agredidos fisicamente pelo mesmo motivo. O relatório também mostra que 56% dos estudantes LGBT foram assediados sexualmente na escola, tido como um local de hostilidade e conivente com os agressores.

 

Sobreviver LGBT

Quando é o caso do LGBT se assumir para a família e se colocar no mundo a partir do seu próprio eu, além do desgaste familiar em casos que não há acolhimento, a autonomia financeira pode ser uma alternativa de busca por inserção na sociedade. No entanto, até mesmo essas portas podem ser difíceis de abrir para essa população que já vem enfrentando um cenário de hostilidade e violência. 

O preconceito contra LGBTs se estende de forma brutal no mercado de trabalho é o que revela pesquisa do grupo Santo Caos. Segundo o levantamento, 41% dos entrevistados afirmam terem sofrido discriminação por sua orientação sexual ou identidade de gênero no ambiente de trabalho e 61% dxs funcionárixs LGBT no Brasil optam por esconder a sexualidade de colegas e gestores. 

A situação se torna ainda mais complexa quando se trata de emprego e renda, 33% das empresas brasileiras não contratariam pessoas LGBT para cargos de chefia e 90% de travestis estão se prostituindo por não terem conseguido emprego, mesmo com bons currículos.

Portanto a autonomia financeira continua sendo um desafio para essa população que enfrenta todos os dias as estatísticas para garantir a própria a própria vida. 

Nos dois primeiros meses de 2020, o Brasil apresentou aumento de 90% no número de casos de assassinatos de travestis e transexuais, em relação ao mesmo período de 2019. Esse dado faz parte do Dossiê dos Assassinatos e da Violência Contra Pessoas Trans Brasileiras, feito pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais – ANTRA. 

E mais uma vez, as LGBT’s do sexo feminino foram as que mais sofreram. Segundo a ANTRA, 98% dos assassinatos afetaram transgêneros do sexo feminino, e apenas 8% dos casos tiveram seus autores identificados por autoridades, ao longo do ano passado. Em 80% dos assassinatos houve requintes de crueldade — uso de violência excessiva.

Ainda em 2019, o Brasil continua sendo o país que mais mata travestis e transexuais no mundo. O país passou do 55º lugar de 2018 para o 68º em 2019 no ranking de países seguros para a população LGBT.

Os dados da Antra mostram que o Nordeste é a região com mais casos, concentrando 45 assassinatos — ou 37% do total.O Ceará é o estado nordestino com mais casos (8), seguido por Bahia (8) e Pernambuco (8). Em décimo lugar, está o Maranhão (5). Após o Nordeste, a Região Sudeste é a mais transfóbica do país, tendo registrado 37 assassinatos no ano passado. Em seguida, está a Região Sul (14), o Norte (14) e Centro-Oeste (12).

A arma de fogo foi a principal ferramenta utilizada para matar transgêneros, segundo a Antra. Enquanto 43% dos crimes foram realizados com armas de fogo, 28% se utilizaram de armas brancas. Espancamento e asfixia corresponderam a 15% dos casos. Além disso, houve dois assassinatos por apedrejamento.

 

Futuro LGBT — viver sem medo

No dia 13 de junho de 2019, a Justiça dava um passo histórico na luta contra a LGBTfobia. No início da noite de uma quinta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovava por 8 votos a 3 a criminalização da homofobia e da transfobia no Brasil. Com a decisão, atos preconceituosos contra homossexuais e transexuais passaram a configurar crime com pena de um a três anos, além da aplicação de multa.

Apesar dos retrocessos com o fim dos governos Lula e Dilma, a militância LGBT do Partido dos Trabalhadores segue firme ao lado dos movimentos civis e sociais pela defesa da população LGBT, pelo direito à vida e por todas as formas de amar. Os parlamentares e executivos do PT na Câmara Federal, no Senado, nas Câmaras municipais, nas Prefeituras, nos Governos estaduais estão ao lado da  população LGBT travando trincheira na defesa dos Direitos Humanos e pelo direito à diversidade sexual. 

Atualmente, tramita na Câmara dos Deputados o PL 7582/14, que tipifica os crimes de ódio entre eles a LGBTfobia, de autoria de Maria do Rosário (PT/RS) com parecer do Deputado Carlos Veras aprovado em 2019 na CDHM; e o PL 7292/2017, que prevê o LGBTcídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio (Projeto de Lei Dandara), de autoria de Luizianne Lins (PT/CE), e, também, o *PL 3774/2019*, de Maria do Rosário, que dispõe sobre a obrigatoriedade do registro de violência LGBTfóbica nos Boletins de Ocorrência nas delegacias e no sistema de saúde.

 

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