Nordeste, terra de povo guerreiro e trabalhador igual a Lula

Também terra de gente como o educador Paulo Freire, brasileiro mais homenageado da história, região resiste à destruição bolsonarista com integração entre governadores

Nordeste, terra de povo guerreiro e trabalhador igual a Lula. Foto: Ricardo Stuckert

Uma semana após o Nordeste ser alvejado por ataques bolsonaristas, motivados pela votação consagradora de Luiz Inácio Lula da Silva na região, os nordestinos voltam a receber os candidatos à Presidência da República. Lula está na terra onde o Brasil nasceu desde esta quarta-feira (12), quando caminhou ao lado de uma multidão em Salvador, fazendo crescer na primeira capital brasileira a vontade de viver em paz e melhor.

Jair Bolsonaro desembarca nesta quinta-feira (13) em Pernambuco. Na terra natal do recifense Paulo Freire – patrono da Educação nacional e brasileiro mais homenageado da história, com pelo menos 35 títulos de Doutor Honoris Causa de universidades da Europa e América –, o futuro ex-presidente poderia receber algumas lições de como o Nordeste, que ele odeia e despreza, tornou-se o farol da educação pública no país.

A analogia é da presidente-executiva da ONG Todos pela Educação, Priscila Cruz, em entrevista à coluna do jornalista Carlos Madeiro no portal UOL. “Os exemplos de Pernambuco no ensino médio; do Ceará na alfabetização e ensino fundamental 1 e 2; as experiências de Teresina (PI) e Coruripe (AL) têm sido replicadas no Brasil”, enumera.

Para a dirigente, “qualquer pessoa que faça ataque à educação do Nordeste tem um total desconhecimento da realidade. Isso só reflete uma aversão a dados”. Hoje, diz ela, a evidência científica é que o Nordeste é justamente a grande referência educacional do país. “Só quem nega a ciência é que não enxerga a realidade”, critica Priscila.

É dessa forma, negando a ciência e propalando uma realidade “fake”, que o inquilino do Planalto subestima a importância do Nordeste, berço histórico da economia brasileira e região mais rica do país até fins do Século 18. Mas “como vovó já me dizia”, cantaria o baiano Raul Seixas, quem fala o que quer ouve o que não quer. E toda vez que abre a boca para lançar maledicência sobre os nordestinos, Bolsonaro recebe uma lição.

Governadores unidos preservam saúde e dignidade da população

Foi assim durante a pandemia. Enquanto o chefe do Executivo e seus cúmplices promoviam de dentro da máquina do Estado campanhas contra as medidas sanitárias e socioeconômicas de proteção da população, causando centenas de milhares de mortes evitáveis, o Nordeste se tornou a região com a menor média de óbitos por Covid-19.

Sergio Rezende, ministro da Ciência e Tecnologia no Governo Lula (2005-2010) e um dos coordenadores do Comitê Científico de Combate ao Coronavírus do Consórcio Nordeste, descreveu em artigo como a região ensinou o país a se proteger não apenas do coronavírus, mas também da pestilência bolsonarista. Aos sobreviventes enlutados, os governadores nordestinos destinaram solidariedade como dever do Estado.

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Criado em 2019 para integrar ainda mais os nove estados da região, o Consórcio Nordeste lançou em agosto de 2021 o Acolhe Nordeste. Inédito no país, o programa social irá amparar, até a maioridade, crianças e adolescentes órfãos de vítimas da Covid-19 – e de Bolsonaro.

“O que estamos fazendo hoje com o lançamento do Nordeste Acolhe não é caridade”, afirmou na ocasião Fátima Bezerra. “É dever do Estado e direito de cidadania. É a visão de uma região cujos gestores e gestoras têm sensibilidade social e sabem que governar é, principalmente, cuidar das pessoas”, pontuou a governadora do Rio Grande do Norte, reeleita no primeiro turno destas eleições com mais de 58% dos votos válidos.

Cuidando dos nordestinos, Lula e Dilma fizeram o Nordeste crescer como nunca

A vontade de cuidar das pessoas moveu os governos de Lula e Dilma Rousseff a olhar com outros olhos para o Nordeste. A pobreza, a fome, a falta de oportunidades são resultado de decisões e projetos de poder, um conjunto de injustiças que compõem um fenômeno multidimensional e que se relaciona com diversos outros.

A partir dessa visão, os governos do PT tiraram 36 milhões de brasileiras e brasileiros da pobreza extrema. Boa parte delas, no Nordeste.

A região, com área equivalente à da Mongólia e número de habitantes equivalente ao da África do Sul, possui o terceiro maior território, segunda maior população e terceiro maior Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. E nos 13 anos de governos do PT viveu uma revolução socioeconômica que a transformou na “China brasileira”, com o PIB crescendo acima da média nacional.

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Entre 2003 e 2015, o Nordeste registrou expansão econômica de 3,3% como média anual, enquanto o Sudeste e Sul cresciam 2,6% e 2,4%, respectivamente, apontam as Contas Regionais do Brasil do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).

Os bons resultados do Nordeste vieram do protagonismo de setores como indústria, agropecuária e serviços. Com a expansão acima da média nacional, o Nordeste elevou a participação do PIB nacional de 12,8%, em 2003, para 14,2% em 2015. No mesmo período, o Sudeste e o Sul decaíram relativamente do PIB nacional de 55,03% para 53,17% e de 17,91% para 17,02%, respectivamente.

Em 2002, apenas cinco milhões de nordestinos tinham emprego formal. Já em 2013, esse número passou para quase nove milhões. Em 2002, quando o presidente Lula foi eleito, mais de 21,4 milhões de nordestinos viviam em situação de pobreza. Em 2012, o número havia caído para 9,6 milhões, segundo estudo da Fundação Perseu Abramo, com base em dados do IBGE.

Alguns fatores que ocasionaram esse “milagre nordestino” foram a implantação de medidas sociais visando ampliar a transferência de renda, o aumento do salário mínimo, a oferta de crédito familiar e empresarial, os investimentos retomados aos setores públicos e privados e a estabilização dos preços.

A chegada de mais empresas privadas, estimuladas por iniciativas governamentais, apontou para a decolagem da região assentada pela concentração de compras em setores como habitação, automóveis e motos. Também notebooks, smartphones e tablets.

O Nordeste não apenas crescia econômica e socialmente, como isso ocorria de forma sustentável. A interiorização do ensino médio e superior e a pulverização de empreendedores gerou maior sofisticação e diversificação do padrão de consumo. Ao mesmo tempo, o interior passou a crescer mais rapidamente que as capitais, invertendo a tradicional relação verificada em outras regiões, de concentração da riqueza nas regiões metropolitanas.

Após longo tempo de estagnação, a região partia de um ponto mais baixo na escala do desenvolvimento e, com políticas públicas que estimularam a geração de emprego e renda, projetava a reconfiguração de uma classe média superior a metade da população.

Artes, cultura e um povo porreta. Tudo isso tem no Nordeste

Além de receber aulas sobre a educação no sagrado e castigado chão nordestino, Bolsonaro também poderia se debruçar sobre as obras de grandes nomes da literatura nacional, como João Cabral de Melo Neto, José de Alencar, Jorge Amado, Nelson Rodrigues, Rachel de Queiroz, Gregório de Matos, Clarice Lispector, Graciliano Ramos, Ferreira Gullar e Manuel Bandeira, dentre tantos outros. Mas ele prefere clubes de tiro a clubes de leitura.

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Ouvir o som de compositores eruditos nordestinos como Alberto Nepomuceno e Paurillo Barroso. Ou populares como Luiz Gonzaga, Dominguinhos, Sivuca, Jackson do Pandeiro, João do Vale, Alceu Valença, Geraldo Azevedo, João Gilberto, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Maria Bethânia, Tom Zé, Belchior, Chico Science, Daniela Mercury e o jovem João Gomes, de uma lista interminável de grandes músicos. Mas ele prefere o ruído das motociatas com dinheiro público.

Poderia dançar coco, xaxado, martelo agalopado, maracatu, tambor de crioula, bumba-meu-boi, samba de roda, baião, xote, forró, Axé, frevo ou pisadinha. E se deleitar com a poesia popular, o cordel do paraibano Leandro Gomes de Barros, o repente de Zé Pretinho e Cego Aderaldo, o Movimento Armorial inspirado por Ariano Suassuna e o artesanato popular. Mas quem tem o coração duro, como Bolsonaro, também é um cintura dura com ouvidos apenas para o ódio.

Com fome, o inquilino do Planalto poderia se servir de uma buchada, cabritada, sarapatel ou acarajé – tudo preparado com ingredientes criados e cultivados por agricultores familiares. Acontece que, nesses quase quatro anos de desgoverno, Bolsonaro foi particularmente cruel com a agricultura familiar, que produz mais de 70% da comida que chega às mesas das famílias brasileiras.

Porque querem voltar a comer bem, festejar sua diversidade e viver feliz, os nordestinos recebem Bolsonaro como a visita indesejada. Daquelas que a gente bota uma vassoura de ponta da cabeça atrás da porta para que vá embora logo. Falta pouco para isso acontecer.

Da Redação

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