Bolsonaro confessa usar governo para beneficiar família e amigos

O que moveu o presidente da República em sua tresloucada intervenção na reunião ministerial, há um mês, era o temor do avanço das investigações da PF contra o filho Flávio Bolsonaro e o misterioso “amigo”, cujas suspeitas recaem sobre o ex-assessor Fabrício Queiroz

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Bolsonaro desrespeita institucionalidade do cargo de presidente da República.

A intervenção de Bolsonaro na Polícia Federal (PF) saiu do terreno da especulação e ganhou contornos de fato, com direito a imagem e som, na famigerada reunião ministerial ocorrida em 22 de abril. Com a liberação do sigilo, por decisão do relator do inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, na última sexta-feira (22), o que se vê é a confissão de um crime contra a administração pública. O vídeo veio a público após Bolsonaro negar ter feito referência à Polícia Federal na reunião e insistir na tese que queria trocar a segurança pessoal de sua família.

Nas palavras de Bolsonaro:  “Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa”, disse, ele aos gritos, na famigerada reunião ministerial. E continuou: “Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”.

O alvo de Bolsonaro era a Superintendência da Policia Federal no Rio de Janeiro que, segundo de acordo com o próprio presidente, não estaria passando informações a ele, como esperava, sobre investigações de seu interesse. De acordo como ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, tratado como “bonitinho” na reunião, Bolsonaro teria dito que “queria” apenas a Superintendência do Rio de Janeiro, podendo ele (Moro) ficar todas as demais.

O que moveu Bolsonaro em sua tresloucada intervenção nada republicana foi o temor diante das investigações contra o filho Flávio Bolsonaro e o “amigo”, supostamente Fabrício Queiroz. O “amigo” é alvo de investigação por lavagem de dinheiro, após o antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificar transações suspeitas feitas pelo então deputado estadual. A investigação envolve a prática de “rachadinha” no gabinete de Flávio Bolsonaro, esquema em que assessores parlamentares devolvem parte do salário aos políticos.

A intenção anunciada pelo presidente veio apenas dois dias depois, em 24 de abril, com a demissão do delegado Maurício Valeixo do cargo de diretor-geral da Polícia Federal. Afastado por telefone pelo próprio Bolsonaro durante a noite de 23, a demissão “a pedido” foi publicada no Diário Oficial sem a assinatura do ministro da Justiça. A situação levou Moro a pedir demissão, depois de cerca de 14 meses à frente da pasta dando cobertura às suspeitas que pesam contra membros do governo, como o ministro do Turismo, Marcelo Antônio, do próprio presidente, que teve acesso a inquérito confidencial sobre o caso do laranjal do PSL em Minas Gerais, e do filho do presidente, investigado no caso da Alerj. Moro já vinha cumprindo tabelinha com o presidente. Ao afastar Lula das eleições, o então juiz federal tornou possível a eleição de Bolsonaro e ganhou, entre o primeiro e segundo turnos, o cargo de ministro da Justiça.

Na reunião de 22 de abril, Bolsonaro foi ainda mais longe. Tentando disfarçar a ameaça aos ministros, o presidente deixou claro seu objetivo de extrapolar os limites da legalidade no desempenho de suas funções. “Por isso, vou interferir! E ponto final, pô! Não é ameaça, não é uma … urna extrapolação da minha parte. É uma verdade. Como eu falei, né? Dei os ministérios pros senhores. O poder de veto. Mudou agora. Tem que mudar, pô”, disse.

Para justificar a interferência na estrutura de Estado para atender aos seus interesses particulares e familiares, Bolsonaro detonou os serviços de informação oficiais à disposição da Presidência da República. “Eu não posso ser surpreendido com notícias. Pô, eu tenho a PF que não me dá informações. Eu tenho as inteligências das Forças Armadas que não tem informações; a Abin tem os seus problemas, tenho algumas informações. Só não tem mais porque tá faltando realmente, temos problemas, pô! Aparelhamento etc. Mas a gente num pode viver sem informação”.

Ao crime confesso, Bolsonaro também admitiu que opera paralelamente aos instrumentos de segurança do Estado, assegurados constitucionalmente. Ele confessou que tem um sistema de informações e espionagem que opera paralelo aos órgãos do Estado brasileiro.  “O meu [serviço de informações] particular funciona. Os que tem oficialmente, desinformam”, disse. “Prefiro não ter informação do que ser desinformado por sistema de informações que eu tenho”.

Sem explicar qual é o seu próprio “sistema de informações”, Bolsonaro fortaleceu a especulação sobre o envolvimento de milícias em seu governo. Somado à irresponsabilidade diante da pandemia, são fatos que reforçam a necessidade do impeachment.

Da Redação

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