Foro de São Paulo: seminário debate como combater fake news da extrema direita

Pesquisadores mostram como ultraconservadores investem em histórias capazes de envolver o público com o objetivo final de criminalizar partidos e movimentos progressistas

Leo Oliveira

A presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, apresenta os pesquisadores Fernanda Sarkis e Marcus Nogueira (à direita)

Como a extrema direita cria, espalha e articula internacionalmente fake news e desinformações contra o campo progressista? Essa questão foi o tema central de  seminário realizado, neste sábado (1º), dentro da programação da 26ª Reunião do Foro de São Paulo, em Brasília (assista no vídeo abaixo). 

A apresentação ficou a cargo dos pesquisadores Fernanda Sarkis e Marcus Nogueira, que há anos estudam os ecossistemas de desinformação criados e alimentados pela ultradireita no Brasil e no mundo.

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Segundo os dois, a direita conservadora e liberal do mundo começou, décadas atrás, a traçar novas estratégias para capturar “corações e mentes” por meio de discursos disseminados na internet. Com isso, surgiram think tanks da direita dedicados exclusivamente à formação da opinião pública. 

“Eles não têm outra função se não trabalhar a mobilização de agentes, a formação e o posicionamento das fontes de informação”, resumiu Marcus Nogueira.

Hollywood na política

A principal arma utilizada por esses grupos é a construção de histórias emocionalmente envolventes cujo objetivo é, segundo as próprias palavras de um desses think tanks, “envelhecer a esquerda e disputar a pobreza”. 

E, para a criação dessas histórias, eles apelam não para a verdade, mas para as mesmas estratégias utilizadas por Hollywood para prender a atenção da audiência.

O resultado são narrativas bem contadas e que fazem sentido, mesmo que não tenham compromisso com a realidade. É a trama, a história contada de uma maneira especial, que fornece um valor de verdade, envolve e mobiliza as pessoas.

Esses enredos, então, são disseminados e alimentados pelo trabalho de lideranças treinadas para isso. “Todas essas novas lideranças que sabem falar bem, que repetem o mesmo discurso, são fruto de treino e de formação. Isso se dá com nivelamento, financiamento, que cria um ciclo de informação para as pessoas aprenderem a contar boas histórias”, explicou Nogueira.

E, graças à característica interativa da internet, várias pessoas capturadas por aquela história se tornam dispostas a repeti-la, sentindo-se coautoras dessa versão. E, assim, as narrativas ganham uma enorme força, mesmo que não sejam verdadeiras.

Foro de São Paulo no centro da trama

E que história vem sendo contada no Brasil e nos demais países latino-americanos? Segundo os dois especialistas, um enredo que tem no próprio Foro de São Paulo um dos elementos centrais.

Nesse roteiro, o Foro de São Paulo é uma organização clandestina, que se reúne secretamente com o objetivo de implementar uma dominação totalitária, ditatorial e comunista no continente.

Sarkis contou que influenciadores da direita costumam assistir a todos os vídeos do Foro disponíveis na internet para, depois, editá-los e selecionar fragmentos para construir uma outra história. “É a partir desse arco narrativo que todas as fake news vão ganhando uma dita coerência”, observou a pesquisadora. 

Essa estratégia cria um outro fenômeno intrigante, que é o de determinadas frases ou falas ganharem um sentido completamente diferente do original dentro da rede da extrema direita. Isso é observado com a figura de Paulo Freire, por exemplo. 

Segundo Sarkis, as mesmas citações do educador utilizadas nas redes progressistas aparecem nas redes conservadoras, mas o contexto narrativo as torna imediatamente pejorativas.

Uma guerra no labirinto de desinformação

No fim, o público capturado pela narrativa da extrema direita passa a acreditar que há uma guerra internacional em curso nos campos da cultura e dos costumes. 

Como numa típica trama hollywoodiana, de um lado dessa guerra estão os mocinhos — a “nova direita” — e do outro os vilões do Foro de São Paulo, a “velha esquerda” que secretamente busca implementar uma ditadura comunista e corrupta, aliada ao narcotráfico, e que, se for vitoriosa, vai impor ao mundo a “ideologia de gênero”, o aborto, o fim do cristianismo, o fim da família.  

Um efeito importante dessa história é o de ligar imediatamente temas que, a princípio, não têm relação, como aborto, narcotráfico, comunismo e corrupção.

“Todo e qualquer discurso que entra por alguma dessas portas desse labirinto passa por todas as outras. Esse labirinto coloca a esquerda e os progressistas, muitas vezes, numa falta de saída, porque esses argumentos estão aparentemente tão sólidos nos discursos dessa rede que você não consegue sair”, explicou Sarkis.

Como combater a desinformação?

Essa estratégia se mostra extremamente perigosa porque, no fim, busca criminalizar os movimentos e partidos de esquerda. “Essa estratégia marca algo muito importante para eles, que é o processo de criminalização da esquerda. Esse exercício é, sobretudo, para criminalizar os partidos e movimentos de esquerda”, alertou Sarkis.

Daí a importância de combater essa narrativa. Mas qual seria a melhor forma de fazer isso? Segundo os pesquisadores, encontrando formas de desconstruir essa história mais ampla e não atacando as fake news uma a uma.

Combater as fake news individualmente não funciona”, resumiu Marcus Nogueira. “A gente precisa entender a dramaturgia em torno da narração construtiva que eles estão apresentando.”

Da Redação

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