‘Logística’ da Saúde produz encalhe de 4 milhões de comprimidos de cloroquina
Em 6 de junho, o site do PT Nacional alertou que o governo e Exército investiram R$ 1,5 bilhão para produzir o remédio desautorizado pelas autoridades sanitários. Em 15 de junho, o deputado e líder do PT na Câmara, Rogério Correia (MG) entrou com uma representação na Procuradoria-Geral da República (PGR), contra o presidente Jair Bolsonaro, pela prática de improbidade administrativa
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O mistério envolvendo a cloroquina ganhou novos contornos que já ultrapassam os limites da irresponsabilidade. Na quinta-feira, o jornal Folha de S. Paulo denunciou que “o governo Bolsonaro tem estoque parado de 4 milhões de comprimidos de cloroquina”. Em 6 de junho, o site do PT Nacional alertou que o governo e Exército investiram R$ 1,5 bilhão para produzir o remédio desautorizado pelas autoridades sanitários. Em 15 de junho, o deputado e líder do PT na Câmara, Rogério Correia (MG) entrou com uma representação na Procuradoria-Geral da República (PGR), contra o presidente Jair Bolsonaro, pela prática de improbidade administrativa.
Em maio, técnicos do próprio Ministério da Saúde alertaram para risco do medicamento encalhar nos depósitos militares. De acordo com documento obtido pelo jornal Folha de S. Paulo, o alerta dos técnicos ocorreu em uma reunião no dia 25 de maio, quando o ministério negociava a vinda de três toneladas de insumos para produzir a cloroquina. “Devido a atual situação não é aconselhável trazer uma quantidade muito grande, pois caso o protocolo venha a mudar, podemos ficar com um número em estoque parado para prestar contas”, diz documento que registrou a reunião. O protocolo mudou e o ministro interino e especialista em logística, general Pazuello, ficou com um estoque de cloroquina capaz de atender o consumo normal do medicamento por 18 anos.
Diante da irresponsabilidade, que desviou recursos de outras necessidades, o governo avançou ainda mais em sua campanha pelo uso indevido do remédio. Após se declarar infectado, Bolsonaro intensificou a campanha em defesa da cloroquina em lives e aparições públicas nas áreas reservadas do Palácio, junto aos apoiadores que entoam cantos à cloroquina. Também infectados, os ministros Onyx Lorenzoni, da Cidadania, e Milton Ribeiro, da Educação, tornaram público o uso do produto indicado pelo presidente. O resultado é a falta do remédio nas farmácias, alta dos preços e piora da saúde de pacientes com lúpus e outras doenças inflamatórias autoimunes.
Além disso, os recursos desviados para sustentar a campanha publicitária do presidente Bolsonaro e do Exército foram responsáveis, em boa parte, pelo aumento da contaminação e das mortes no país. Em consequência, a compra de equipamentos médicos de proteção, respiradores e testes para checagem da população não se efetivaram. Dos R$ 11,4 bilhões reservados pelo ministério para compra de equipamentos de proteção aos profissionais de saúde, só foram liberados 25%. A morte de profissionais da saúde só não é maior devido a iniciativa das administrações estaduais e municipais que, dentro do possível, providenciaram os equipamentos necessários.
“O fato é que o governo federal abriu mão de seu papel constitucional de coordenação e condução do esforço nacional de combate à Covid-19, com evidentes prejuízos à capacidade do país em reduzir os impactos da doença”, denunciaram os ex-ministros da Saúde Alexandre Padilha, Arthur Chioro, Barjas Negri, Humberto Costa, José Gomes Temporão, José Saraiva Felipe e Luiz Henrique Mandetta, em artigo conjunto na Folha de S.Paulo. “A gestão militarizada do Ministério da Saúde não trouxe nenhum ganho em eficiência logística e sequer tem sido capaz de adquirir os testes necessários ou de executar os recursos orçamentários disponibilizados, já que apenas 30% foram gastos até agora”, apontaram os ex-ministros.