Lula: “Nunca foi tão urgente ampliar a cooperação pela preservação da Amazônia”

Presidente abriu, nesta terça-feira (8), em Belém (PA), a Cúpula da Amazônia, que reúne representantes dos oito países da região. Veja a Declaração de Belém pelos Presidentes dos Estados Partes no Tratado de Cooperação Amazônica

Ricardo Stuckert

Lula, na abertura da Cúpula: “É motivo de muita alegria reencontrar os líderes dos países da América do Sul para tratar da Amazônia, este patrimônio comum de nossos países"

O presidente Lula abriu, nesta terça-feira (8), em Belém (PA), a Cúpula da Amazônia, que reúne presidentes e representantes de oito países da região, além de nações de outros continentes. Lula ressaltou que “nunca foi tão urgente retomar e ampliar” a cooperação entre os países que têm a floresta em seu território.

“É motivo de muita alegria reencontrar os líderes dos países da América do Sul para tratar da Amazônia, este patrimônio comum de nossos países. Desde que o Tratado de Cooperação da Amazônia foi assinado, em 1978, os chefes de Estado só se encontraram três vezes: em 1989, 1992 e 2009. Todas elas em Manaus. Há quatorze anos que não nos reuníamos. É a primeira vez que o fazemos aqui no Pará e a primeira vez num contexto de severo agravamento da crise climática. Nunca foi tão urgente retomar e ampliar essa cooperação”, disse Lula.

Documento oficialDeclaração de Belém pelos Presidentes dos Estados Partes no Tratado de Cooperação Amazônica

A cúpula, que termina na quarta-feira (9), reúne os países signatários do Tratado de Cooperação da Amazônia – Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela. Também participam Indonésia, República do Congo e República Democrática do Congo, que, igualmente, abrigam grandes florestas. O encontro conta ainda com a presença de representantes de países como Noruega e Alemanha, os maiores doadores do Fundo Amazônia, que financia projetos de preservação da floresta.

Lula afirmou que os desafios atuais e as oportunidades que surgem demandam uma ação conjunta que atenda aos interesses de cada um dos países da região.

“A Amazônia não é e não pode ser tratada como um grande depósito de riqueza. Ela é uma incubadora de conhecimentos e tecnologias que mal conhecemos e começamos a dimensionar”, disse. “Aqui podem estar soluções para inúmeros problemas da humanidade, da cura de doenças ao comércio mais sustentável. A floresta não é um vazio a ser ocupado nem um tesouro a ser saqueado. É um canteiro de possibilidades que precisa ser cultivado”, acrescentou o presidente, que detalhou os três principais propósitos da cúpula.

“Primeiro, vamos discutir e promover uma nova visão de desenvolvimento sustentável e inclusivo na região, combinando a proteção ambiental com a geração de empregos dignos e a defesa dos direitos de quem vive na Amazônia. Precisaremos conciliar a proteção ambiental com a inclusão social; o fomento à ciência, tecnologia e inovação; o estímulo à economia local; o combate ao crime internacional; e a valorização dos povos indígenas e comunidades tradicionais e seus conhecimentos ancestrais”, disse.

Em segundo lugar, destacou, estão as medidas para o fortalecimento da Organização do Tratado de Cooperação da Amazônia (OTCA), “um legado construído ao longo de quase meio século e representa o único bloco do mundo que nasceu com uma missão socioambiental”.

Lula pontuou que com a ampliação e aprofundamento das iniciativas de cooperação, coordenação e integração entre os membros da OTCA será possível assegurar que a visão de desenvolvimento sustentável tenha vida longa e amplo alcance.

Já o terceiro propósito do encontro, conforme o presidente, é “fortaleceremos o lugar dos países detentores das florestas tropicais na agenda global, em temas que vão do enfrentamento à mudança do clima à reforma do sistema financeiro internacional”.

Diálogos Amazônicos

Ao final do discurso, Lula anunciou que, na sequência, falariam participantes dos Diálogos Amazônicos, evento preparatório que reuniu, entre os dias 4 e 6 de agosto, em Belém, cerca de 24 mil pessoas, entre representantes de movimentos sociais, do setor produtivo, além de ambientalistas, ativistas e populações tradicionais, como povos indígenas. Diversas agências das Nações Unidas contribuíram com os debates, cujos resultados serão encaminhados aos líderes que se reúnem a partir de terça-feira (8).

Lula também agradeceu ao presidente da Colômbia, Gustavo Petro, por ter promovido a Reunião Técnico-Científica da Amazônia, no início de julho, em Letícia, com contribuições relevantes para a cúpula de Belém. “Todos esses múltiplos aportes dão corpo e alma à declaração de Belém, documento negociado entre os nossos oito países, que propõe um ambicioso conjunto de ações para a região”, disse o presidente brasileiro sobre o documento que será divulgado pela Cúpula da Amazônia.

A declaração tem o objetivo de estabelecer uma nova agenda comum para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, conciliando: a proteção do bioma e da bacia hidrográfica; inclusão social; fomento de ciência; tecnologia e inovação; e o estímulo à economia local e valorização dos povos indígenas, comunidades locais e tradicionais e de seus conhecimentos ancestrais.

“A declaração presidencial desta cúpula mostra que o que começamos em Letícia e agora consolidamos em Belém não é apenas uma mensagem política, é um plano de ação detalhado e abrangente para o desenvolvimento sustentável da Amazônia”, afirmou o chefe do governo brasileiro.

Negacionismo

Ao afirmar que a Cúpula da Amazônia abrirá uma nova página das relações da América do Sul com o mundo, Lula falou sobre os esforços do governo brasileiro para reverter uma série de retrocessos ambientais verificados durante a presidência negacionista de Jair Bolsonaro, que abalaram a credibilidade do país junto à comunidade internacional.

Lula disse que políticas importantes para o setor, que resultaram em avanços no monitoramento e na redução do desmatamento na Amazônia, foram destruídas nos últimos anos.

“Não resolvemos todos os problemas, mas começamos a trilhar um caminho mais justo e sustentável. No entanto, a crise política que se abateu sobre o Brasil levou ao poder um governo negacionista com consequências nefastas. Meu antecessor abriu as portas para os ilícitos ambientais e o crime organizado. Os índices de desmatamento voltaram a crescer. Suas políticas beneficiaram apenas uma minoria que visa o lucro imediato”, afirmou o presidente. “Felizmente, pela decisão soberana do povo brasileiro e seu compromisso com a democracia, conseguimos virar essa triste página da nossa história”.

Lula falou também sobre os planos para mudar a realidade da floresta a partir de agora. “Estamos empenhados em reverter esse quadro. Já podemos ver resultados. Os alertas de desmatamento na Amazônia tiveram uma redução de 42,5% nos primeiros sete meses deste ano. Assumimos o compromisso de zerar o desmatamento até 2030”, afirmou.

“Vamos estabelecer, em Manaus, um Centro de Cooperação Policial Internacional para enfrentar os crimes que afetam a região. O novo Plano de Segurança para a Amazônia vai criar 34 novas bases fluviais e terrestres, com a presença constante de forças federais e estaduais”, adiantou. “O apoio das Forças Armadas, sobretudo na faixa de fronteira, também será essencial nesse esforço. Ele também permitirá a futura criação de um sistema integrado de controle de tráfego aéreo na Região Amazônica”.

OTCA

A secretária-Geral da OTCA, María Alexandra Moreira López, afirmou que a Declaração de Belém “é um compromisso inédito e ousado, com uma visão integral e tentando entender a Amazônia dentro de sua grande dimensão como bioma de muitas interconexões que requerem medidas de gestão sistêmicas e transfronteiriças e multinível e que enfrentam várias ameaças que atentam para a sua integridade”.

Ela sublinhou que o agravamento da crise climática torna necessários os esforços para um desmatamento zero na Amazônia até 2030, a partir de medidas como o combate aos ilícitos e ao crime organizado instalado na região.

“Também devemos preservar a biodiversidade e essa máquina perfeita de produção de água, de biodiversidade, que é uma máquina que contribui para uma grande porcentagem de água doce para todo o mundo que se converte em 70% da água para a América do Sul. Devemos sair dessa visão de que os bosques ou florestas tropicais são somente uma aglomeração de árvores e um repositório pacífico ou uma reserva de carbono. Os nossos bosques tropicais e sua tecnologia viva têm uma capacidade importante no condicionamento climático mundial e regional”, afirmou.

Conversa com o presidente

A Cúpula da Amazônia foi um dos principais temas da live Conversa com o presidente, nesta terça-feira (8). Lula afirmou ao jornalista Marcos Uchôa, da EBC, que o evento é importante para uma mudança nas discussões sobre o futuro da maior floresta tropical do planeta.

“A ideia básica é a gente sair daqui preparado para, de forma unificada, todos os países que têm floresta terem uma posição comum, nos Emirados Árabes, na COP-28, e a gente mudar a discussão. E, quando for 2025, todas essas pessoas que defendem a Amazônia, que falam da Amazônia mas que não sabem o que é a Amazônia, terão o direito, o prazer de vir à Amazônia ver de perto o que é isso que tanto encanta o mundo”, disse o presidente, em referência à COP-30, que será realizada em Belém.

Lula reafirmou que o governo não pretende transformar a Amazônia em um santuário mundial, mas abrir espaço para investimentos em pesquisas sobre as potencialidades da região, como, por exemplo, nos setores farmacêutico e de cosméticos.

“Eu não trabalho com a ideia de ver a Amazônia ser um santuário da humanidade. Eu quero que a Amazônia seja um lugar em que o mundo tire proveito para poder experimentar a riqueza da nossa biodiversidade, para a gente saber o que pode fazer a partir dessa riqueza da biodiversidade”, disse. “Mas nós precisamos, primeiro, valorizar os cientistas brasileiros, os institutos que já cuidam disso no Brasil e que, muitas vezes, não têm nem dinheiro para fazer as pesquisas corretas. Então, a partir desse encontro, as coisas vão mudar”.

Lula também destacou que a cúpula de Belém é histórica pelo fato de reunir todos os oito países amazônicos. “Já houve outras reuniões, mas esta é a primeira em que os oito estão participando, mais dois países africanos e mais um país asiático que é a Indonésia. Mas a gente pode chamar mais gente para fazer essa discussão”, declarou.

O presidente reforçou que os países desenvolvidos que cobram do Brasil a preservação da Amazônia devem contribuir com recursos para esse fim. “Na medida em que o mundo desenvolvido já destruiu a sua floresta, que já destruiu aquilo que eles tinham no passado, valorizam a floresta? Nós precisamos, então, cobrar. Cobrar deles recursos para que haja investimento e cobrar a participação científica deles”, afirmou.

Da Redação

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