“Mais fortalecidos no espírito”, diz militante sobre ato extremo

Jaime Amorim, um dos grevista de fome pela liberdade de Lula, revela que apesar do cansaço, militantes estão com “certeza da tarefa política”

Adilvane Spezia / MPA e Rede Soberania

Jaime Amorim, MST-PE

Hoje chegamos ao 24º dia de Greve de Fome por Justiça no STF. Acordamos mais fortalecidos no espírito – apesar do corpo mais fadigado, sonolento e cansado –, com mais certeza da nossa tarefa política, neste momento histórico em que o povo clama contra a ameaça da fome, que já atinge mais de 12 milhões de brasileiros. Nosso país saiu do mapa da fome em 2014, um feito histórico importante em nossa construção como Nação, já que pobre no Brasil sempre foi tratado como escravo.

Para os colonizadores e atualmente para a burguesia brasileira, pobre precisa comer pra trabalhar; o resto é mordomia. A fome é consequência dessa cultura escravocrata. Como com a crise e o golpe não há trabalho para todos, para infelicidade de uma pátria destroçada, em dezembro de 2018 o Brasil voltará a fazer parte do mapa mundial da fome.

Nós estamos em greve de fome por opção, como protesto político contra a fome, pela liberdade de Lula e a garantia de suas condições de elegibilidade. Mas milhares de brasileiros passam fome por imposição do modelo econômico adotado pelo golpe. Viveram um ciclo histórico de pleno emprego e hoje estão desempregos, sem esperança, olhando pra frente e não enxergando alternativa.

O pior de toda a crise é a desesperança, quando um povo perde a possibilidade de sonhar. A cada dia que passamos em greve de fome, temos mais clareza de que temos que lutar contra as injustiças, a violência que atinge frontalmente as camadas mais pobres da população brasileira, o desemprego que leva à desesperança a grande parte do povo brasileiro.

Uma greve de fome como instrumento político de luta de um povo deve ter como condição duas questões básicas: ter esgotado todas as possibilidades de reivindicação nas estruturas de poder do Estado e da sociedade e ter como objetivo algo justo. Nossa greve de fome responde a estes dois objetivos, já que no processo de tramitação normal, na política e no Judiciário, não há mais esperança.

Não fazemos greve de fome para defender Lula enquanto cidadão. Estamos em greve de fome por tudo o que Lula representa neste momento político. Ele é a representação dos sonhos, da esperança de todo uma nação. O que estamos reivindicando do Poder Judiciário não é abrir nenhuma exceção ou gerar privilégio, mas tão somente que cumpra a Constituição brasileira e garanta a Lula e a outros 18 mil presos o direito à presunção de inocência. Da presidente do STF, Ministra Cármen Lúcia, que coloque em pauta o julgamento das ADCs. Segundo o relator, ministro Marco Aurélio, o relatório já está pronto para ser apreciado pelo conjunto dos ministros.

A luta pela liberdade de Lula e seu direito de disputar as eleições de outubro está intrinsecamente vinculada às medidas discutidas com Lula pela Frente Brasil Popular durante as caravanas feitas pelo Brasil. Entre elas, realizar, de imediato, um referendo nacional revogatório, que permitirá ao novo Presidente da República consultar a população e tornar sem efeito todas as medidas e reformas aprovadas durante o golpe.

Permitirá implementar uma política econômica que fortaleça o capital nacional e que melhore a vida do povo com trabalho, educação, saúde, transporte, habitação, programas contra a violência, investimentos para produção e comercialização da agricultura camponesa, programas de apoio às populações do semiárido, recuperação de políticas públicas para crianças, mulheres, idosos e jovens. Enfim, que permita ao próximo governo reestabelecer o Estado Democrático de Direito, o equilíbrio entre os poderes e uma política internacional soberana e integradora.

O novo governo também precisará realizar reformas fundamentais que não ocorreram no ciclo anterior. É o caso da reforma do sistema político, que deverá estabelecer um novo sistema eleitoral no Brasil, que permita eleições democráticas e sem controle dos grupos econômicos. Da reforma do Poder Judiciário, com a adoção de sua subordinação a órgãos de controle dos poderes estabelecidos e, fundamentalmente, de um processo eletivo, para que o povo brasileiro possa livremente escolher os juízes e promotores públicos, bem como fixar instrumentos de escolhas para promotores e juízes de todas as instâncias.

Da reforma dos meios de comunicação, com o fim dos monopólios do sistema. Da reforma tributária, para estabelecer um novo sistema de tributação no Brasil que permita uma melhor distribuição entre os entes federativos, cobre impostos dos ricos sobre renda e sobre as grandes fortunas, e crie um sistema de impostos por circulação financeira e outros específicos para programas de saúde e educação.

Também será preciso desenvolver um amplo programa de reforma agrária, que estabeleça tamanho máximo da propriedade da terra no campo; a atualização dos índices de produtividade; um programa amplo de desapropriação, assentando prioritariamente as mais de 100 mil famílias acampadas; que crie programas de crédito, assistência técnica, comercialização e agroindústria; que possibilite crédito voltado à transição e produção agroecológica, recuperação de florestas, matas ciliares margens de rios, córregos e igarapés. E realizar a reforma urbana, garantindo que todas as famílias tenham direito à moradia digna, com o fim da especulação de terras em áreas urbanas e um transporte urbano público de qualidade e acessível para todos.

Enfim, estamos em greve porque defendemos um país com democracia plena, com instrumentos políticos e jurídicos que possam ouvir o povo democraticamente em temas importantes que interessam à população. Um país com soberania nacional, justiça e igualdade social, com distribuição de riqueza e renda, pleno emprego, educação pública de qualidade e gratuita. Com um SUS fortalecido, com reforma agrária e alimento saudável acessível para o todo o povo. São partes dos sonhos que nos movem e nos dão força pra lutar. Por isso continuamos em greve de fome, cada vez mais firmes, por tempo indeterminado, atá que a verdade se estabeleça.

Jaime Amorim é militante do MST de Pernambuco

Por Brasil de Fato

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