Contágio na periferia de São Paulo dispara 45% em uma semana

Propagação do coronavírus é mais veloz nos bairros mais carentes da capital. Os 20 bairros mais ricos da cidade tiveram aumento de 20%. Aumento de mortes por Covid-19 e de casos suspeitos também é maior entre os mais pobres

Rivaldo Gomes/Folhapress

Distrito de Jardim Ângela, na periferia de São Paulo, tem 201 casos confirmados de Covid 19 e outros 281 suspeitos.

Em uma semana, o número de casos confirmados de Covid-19 explodiu na periferia de São Paulo. Dos dias 17 a 24, os 20 distritos mais pobres da capital paulista tiveram aumento de 47,3% no número de casos, de 1.356 para 1.998. Nos 20 distritos considerados mais ricos, o aumento foi de 20,4%, de 2.610 para 3.142, no mesmo período. Além destes, há 2.903 casos suspeitos nos bairros mais pobres e 2.010 nos mais ricos.

O número já deve ser maior, pois a gestão do prefeito Bruno Covas (PSDB) levou cinco dias para divulgar o boletim semanal sobre a pandemia de coronavírus. Há também o problema da subnotificação, já que os testes para detecção da infecção são feitos apenas em casos graves.

Entre os distritos mais pobres, o maior número de casos confirmados se concentra na zona sul da cidade. São 201 casos confirmados no Jardim Ângela e 283 casos suspeitos. Em seguida, vem o Capão Redondo, com 186 casos confirmados e 239 suspeitos. Depois vem o Grajaú, com 162 casos confirmados e 223 suspeitos, com 56% de aumento nos casos. Na zona leste, o Itaim Paulista chegou a 160 casos, aumento de 54%. Brasilândia e Sapopemba, distritos que lideram em número de mortes, têm 130 e 126 casos confirmados, respectivamente.

Nos distritos mais ricos, o maior número de casos confirmados é no Morumbi, onde o primeiro caso foi confirmado no final de fevereiro. São 331 casos confirmados. No entanto, o aumento foi um dos menores em uma semana: 11%. Há outros 65 casos suspeitos no distrito. Depois vem a Vila Mariana, com 264 casos confirmados (+13%) e 171 casos suspeitos. No Jardim Paulista, em terceiro, são 239 casos (+20%) e 135 casos suspeitos.

No total, a capital paulista teve, até a última sexta-feira (24), 45.518 casos notificados suspeitos de covid-19 e 11.025 casos confirmados entre moradores do município.

Mortes por covid-19 na periferia

O crescimento do número de mortes causadas pelo contágio da covid-19 (suspeitas ou confirmadas) na capital paulista reflete a mesma situação do contágio. Embora a pandemia tenha se iniciado nos bairros ricos, na semana entre os dias 17 e 24 de abril houve aumento de 45% nas mortes ocorridas nos 20 distritos mais pobres do município. Já nos 20 distritos mais ricos o aumento foi nove pontos percentuais menor: 36%. A média na cidade foi de 38%.

Em números absolutos, a desigualdade nas mortes causadas pela covid-19 também é clara. Embora tenham um menor número de casos, os 20 distritos mais pobres saltaram de 474 mortes para 689, entre os dias 17 e 24. No mesmo período, os 20 distritos mais ricos tiveram aumento de 263 para 357 no número de mortes. Em toda a cidade, o número total de mortes subiu de 1.935, no dia 17, para 2.688, no dia 24.

Os distritos com o maior número de mortes por covid-19 seguem sendo Brasilândia, na zona norte, com 81, e Sapopemba, na zona leste, com 77. Ambos tiveram aumento em torno de 50%. Já o maior aumento percentual ocorreu no Jardim Helena, também na zona leste, com 120% – de 15 para 33 mortes em uma semana. Já o distrito do Morumbi, onde o primeiro caso foi confirmado, teve uma nova morte por covid-19 em uma semana, indo de sete para oito casos.

O médico infectologista e diretor do Sindicato dos Médicos de São Paulo Gerson Salvador também considera que os dados das mortes por covid-19 evidenciam a desigualdade na capital paulista e expõe a falta de assistência à saúde nos bairros pobres.

“A gente está vendo o número de mortos crescendo desproporcionalmente nos bairros mais pobres. Isso reflete uma iniquidade de acesso à saúde. Nas regiões periféricas tem um contingente de pessoas que dependem unicamente do Sistema Único de Saúde. A gente sabe que outras doenças de transmissão respiratória, por exemplo a tuberculose, acometem de maneira desproporcional as pessoas que vivem na rua, em cortiços e em favelas. O risco de transmissão da covid-19 em pessoas que vivem nessas condições vai ser maior. A falta de assistência e as condições de vida acabam resultando num número desproporcional de mortes na população mais pobre”, disse.

A falta de leitos de UTI na periferia foi evidenciada por um levantamento da Rede Nossa São Paulo. Apenas três distritos – Sé, Vila Mariana e Pinheiros – concentram 60% dos leitos de UTI da cidade. Outros sete distritos – Parelheiros, Cidade Ademar e Campo Limpo, na zona sul; Anhanguera e Tremembé, na zona norte; Aricanduva, na zona leste; e Lapa, na zona oeste – não possuem nenhum leito de UTI, mesmo concentrando 20% da população da cidade (2,3 milhões de pessoas). Outros 16 distritos têm de dois a oito leitos de UTI para cada 100 mil habitantes da região para enfrentar a pandemia de coronavírus. O ideal, segundo a Organização Mundial da Saúde é entre 10 e 30 leitos desse tipo, para cada cem mil habitantes.

Rodrigo Gomes, da Rede Brasil Atual

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