Deputada do PT promove debate sobre Reforma Tributária com foco nas mulheres

Dados apresentados confirmam que mulheres negras são as que mais pagam tributos no Brasil e as que recebem os salários mais baixos

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Deputada Federal Denise Pessôa (PT-RS). Foto: Divulgação

A fim de estimular e promover a participação da mulher na discussão sobre a Reforma Tributária (PEC 45 e PEC 110) a deputada federal Denise Pessôa (PT/RS) propôs reunião na tarde de ontem (21) para debater o tema.

De acordo com a deputada federal gaúcha, há um grupo de trabalho na Câmara para analisar o tema sem a presença de qualquer deputada. “Infelizmente, não há nenhuma mulher participando e resolvemos fazer este debate para dar a nossa contribuição, inclusive, com um relatório e alguns apontamentos com sugestões para encaminhar para esse grupo”.

Com os dados da questão tributária apresentados, chega-se ao à afirmação que população mais pobre acaba pagando mais impostos em cima da sua renda, proporcional à de quem é mais rico. Com isso, a mulher negra que está abaixo na pirâmide social, acaba sendo a pessoa que mais paga impostos.

Aqui vale relembrar o Boletim Especial 8 de março – elaborado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômico (DIEESE), que traz dados sobre os rendimentos das brasileiras.

Sintetiza o boletim:

“As mulheres ganharam, em média, 21% a menos do que os homens – o equivalente a R$ 2.305 para elas e a R$ 2.909 para eles. A maioria dos domicílios, no Brasil, é chefiada por mulheres. Dos 75 milhões de lares, 50,8% tinham liderança feminina, o correspondente a 38,1 milhões de famílias. Já as famílias com chefia masculina somaram 36,9 milhões. As mulheres negras lideravam 21,5 milhões de lares (56,5%) e as não negras, 16,6 milhões (43,5%), no 3º trimestre de 2022. No caso das famílias chefiadas por mulheres negras com filhos, a renda média foi de R$ 2.362,00.”

A representante do Ministério da Fazenda, Fernanda Santiago, apresentou a proposta da criação do Imposto de Valor Agregado (IVA), que é um imposto único que consiste na reunião dos impostos PIS, Cofins, IPI, ISS e ICMS com o objetivo de simplificar a tributação.

Como parte da estratégia para criar uma estratégia que possibilite maior justiça tributária, a assessora especial do Ministro Fernando Haddad, apresentou o conceito do CashBack, que consiste na devolução do tributo para as pessoas mais vulneráveis.

“Será definido ainda quem são essas pessoas vulneráveis e qual o percentual dessa devolução. Mas, em suma, é isto: devolver o para aqueles que a lei complementar entender que não deveria pagar”, relata.

O Cashback do IVA pode beneficiar cerca de 72 milhões de brasileiros mais pobres, sendo 72% negros e 57% mulheres. Com a reforma proposta, 90% dos municípios, que representam 62% da população, aumentarão sua participação no total da arrecadação.

Rever disparidade tributárias

A partir das formulações apresentadas durante a atividade, foi possível constatar que para haver a igualdade social entre mulheres e homens, em especial as mulheres negras, é essencial rever as disparidades tributárias que acabam recaindo sobre a população mais pobre.

É o que explica a advogada e mestranda em Direito pela UFMG, Luiza Machado de Oliveira Menezes. Durante apresentação feita, Machado explicou que o Brasil não avançou no debate para eliminar vieses de gênero na tributação “estamos atrasados com o restante do mundo, inclusive a América Latina”.

Para a advogada e mestranda da UFMG, políticas tributárias podem, sim, contribuir para a redução da desigualdade de gênero e social. Ela relata que na pesquisa que desenvolve foi possível identificar quatro pontos que explicam porque há a disparidade de gênero na tributação indireta brasileira: regressividade total do Sistema Tributário Nacional, tributação e divisão sexual do trabalho, discriminação indireta na tributação sobre produtos relativos ao trabalho de cuidado e discriminação direta na tributação sobre produtos de uso exclusivo ou predominantemente feminino.

No primeiro, os 10% mais pobres – grupo constituído por 42% de mulheres negras e 11% de homens brancos – arcam com uma carga tributária de 26,4%. Ou seja: 1/4 da renda das pessoas mais pobres vai para pagar tributos. Já os 10% mais ricos arcam com uma carga tributária total de 19,2%, fatia composta por 10% de mulheres negras e 42% de homens brancos. Proporcionalmente, os mais ricos pagam menos tributos que os mais pobres.

“Essa relação é lógica, mas não é trivial. A tributação brasileira é regressiva e onera proporcionalmente os mais pobres, e a pobreza no Brasil tem um viés racial e de gênero, logo, são as mulheres negras que arcam proporcionalmente com mais tributos no Brasil. Por isso, precisamos afirmar que o atual sistema tributário brasileiro acentua não apenas a desigualdade social, mas as desigualdades de gênero e de raça”, informa a pesquisadora.

O ponto que trata da tributação e divisão sexual do trabalho faz-se referência à suposta designação do que é ‘trabalho de homem’ (produtivo, remunerado) e ‘trabalho de mulher’ (improdutivo, não remunerado, trabalho doméstico e de cuidado). Sobre isso, a pesquisadora afirmou que homens (brancos, negros, empregados ou desempregados) despendem 11h semanais em trabalho doméstico e de cuidado, enquanto as mulheres despedem 22h semanais de trabalho doméstico e de cuidado. Dados do IBGE de 2019.

“Além de as mulheres gastarem mais horas de trabalho doméstico e de cuidado, a relação desse cenário com a tributação vem com o fato que os lares chefiados por homens gastam mais em aquisição de veículos e imóveis, enquanto que aqueles liderados por mulheres gastam mais na subsistência do lar: alimentação, aluguel, água, energia, higiene, saúde e medicamentos. O modelo tributário que privilegia renda e patrimônio é um fator que prejudica as mulheres”, relata.

A reforma tributária debatida é baseada no consumo e é possível observar que há produtos que têm mais incidência de impostos maior do que outros. “Se a gente comparar hoje o preservativo masculino e uma pílula anticoncepcional, a pílula tem muito mais imposto do que um preservativo. Então, vemos que a seletividade na questão dos impostos também é algo que as mulheres acabam sendo prejudicadas”, reflete a deputada petista.

Apresentação feita pela advogada Luiza Machado de Oliveira Menezes apresenta quadro comparativo com diferença de tributos para produtos relacionados ao trabalho de cuidado

Apresentação feita pela advogada Luiza Machado de Oliveira Menezes apresenta quadro comparativo com diferença de tributos para produtos de uso feminino

Equiparação de direitos entre os gêneros

Com o debate realizado, foi possível constatar a urgência em adotar soluções para diminuir a questão da desigualdade social entre homens e mulheres. E a Reforma Tributária é um instrumento que pode auxiliar nessa equiparação de direitos entre os gêneros.

Para a representante do Ministério das Mulheres, Ana Clara Ferrari, é necessário que as mulheres ocupem os espaços no GT da Reforma Tributária e todo debate que deriva disso.

“Quero, também, dizer que o Ministério das Mulheres está à disposição, inclusive, para fazer esse debate. É uma diretriz de governo que as mulheres estejam em espaços de tomada de decisão, sobretudo em decisões tão estratégicas para o País”, diz a representante do Ministério das Mulheres.

“Quero acrescentar que é esta uma das primeiras vezes que a gente consegue fazer o debate da autonomia econômica atrelado a todo debate da política de cuidados porque quando a gente tem autonomia econômica parece que é só colocar mulher no mercado de trabalho e está resolvida a questão financeira”, continuou.

Quando não fazemos esse debate invisibilizamos uma série de outros desdobramentos que têm sobre a vida das mulheres. Reforma Tributária justa que enfrente as distorções sociais de gênero e de raça e que aumente as contribuições para as rendas mais altas e isente quem vive de salário e faça o sistema de tributação sobre o consumo mais justo para todos e todas”, defende Ferrari.

Para ela, a Reforma Tributária é um instrumento que pode auxiliar nessa equiparação de direitos entre os gêneros. “É importante colocar que a maior parte da população brasileira tem lares que são chefiados por mulheres e é a maior parte.

Então, quando a gente fala em um minoria, na verdade a gente está tratando de uma maioria, quando as mulheres hoje já passaram de 50% da população e são chefes de família, que coordenaram os lares e portanto quando a gente trata de bens essenciais como o preço de uma cesta básica, estamos falando, sim, da vida das mulheres e do que a gente precisa tratar.”

Exemplo de unidade adotado na CPI da Covid

Para a ex-deputada federal e atual secretária Nacional da Aquicultura, Teresa Nelma, é necessário haver pressão da Bancada Feminina da Câmara para cobrarem assento no GT que debate a Reforma Tributária.

“Fico muito preocupada com a Câmara e o Congresso quando eles criaram um grupo para discutir a Reforma Tributária onde nós não vamos participar. Eu acho, deputada Denise, que nós precisamos fazer um grande movimento a nível nacional. Fiquei me lembrando da CPI da Covid, onde as mulheres não iam participar e se fizeram presente e fizeram a grande diferença na CPI”, defende.

A partir do recorte de gênero, a atividade realizada no Auditório Freitas Nobre da Câmara dos Deputados, teve como convidadas:.

– Fernanda Santiago, Assessora Especial do Ministro da Fazenda;

– Ana Clara Ferrari, Coordenadora-Geral da Secretaria Nacional de Autonomia Econômica e Política de Cuidado, representando o Ministério das Mulheres;

– Tathiane Piscitelli, coordenadora do Núcleo de Direito Tributário (NDT) da FGV Direito SP (on-line);

– Melissa Demari, professora assistente da Universidade de Caxias do Sul – UCS (on-line);

– Luiza Machado de Oliveira Menezes, integrante do grupo de estudos de Tributação e Gênero do Núcleo de Direito Tributário (NDT) da FGV Direito SP.

Assista também entrevista da deputada federal Denise Pessôa no Jornal PT Brasil, da TvPT.

Do Elas por Elas

 

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