Francisco Soares: Enem, instrumento de cidadania 

Nos primeiros seis meses de 2015, a Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência do governo federal registrou 179 relatos diários de agressão contra as mulheres. Foram mais…

Nos primeiros seis meses de 2015, a Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência do governo federal registrou 179 relatos diários de agressão contra as mulheres. Foram mais de 32 mil ligações de todas as 27 unidades da federação, envolvendo 55% dos municípios brasileiros.

Recente pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) revela que, entre 2001 e 2011, o Brasil registrou mais de 50 mil mortes de mulheres por agressões. Muitos desses crimes foram cometidos por homens com quem as vitimas tinham ou tiveram vinculo afetivo.

Os dados mostram que, apesar dos avanços alcançados pela Lei Maria da Penha, uma cultura de violência contra as mulheres está ainda muito presente em nosso país.

Diante disso, a discussão da “persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira” é necessária e oportuna. Por isso, foi justamente esse o tema da redação do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) de 2015. A escolha segue a direção de temas de anos anteriores: “publicidade infantil em questão no Brasil” (2014) e “os efeitos da implantação da Lei Seca no Brasil” (2013).

Ao colocar tais questões para a reflexão dos mais de 7,7 milhões de inscritos no Enem, o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) contribui para que os jovens que aspiram a uma vaga nas universidades brasileiras reflitam e posicionem-se.

A discussão em tomo do tema da redação do Enem não se encerra com o término das provas. Ele torna-se assunto de debate nos diversos grupos sociais envolvidos com o exame, tais como grupos familiares, sistemas educacionais, veículos de comunicação, governo e movimentos sociais.

Em relação ao tema deste ano, pode-se buscar os motivos da persistência das agressões contra mulheres, apesar das leis já aprovadas e do protagonismo feminino em nossa sociedade em várias áreas. Por exemplo, 60% dos participantes do Enem são mulheres.

A elaboração de propostas de redação para os exames do Inep segue uma metodologia colegiada. Docentes de universidades, que assesso

ram o órgão na produção dos testes, submetem assuntos inéditos e pertinentes à temática de ordem política, social, cultural ou cientifica.

Esses professores, pertencentes a diversas áreas do conhecimento, colaboram com distintas opiniões sobre o mesmo tema. Os assuntos escolhidos devem possibilitar ao estudante produzir um texto em prosa, do tipo dissertativo argumentativo.

O Enem não é apenas o grande caminho de oportunidades para o acesso à educação superior no Brasil. Pelo tema da redação, ele estimula a reflexão em torno de assuntos fundamentais para a consolidação da democracia e para o aprimoramento da cidadania.

O próprio feto de que alguns sustentem que o tema da redação do Enem deste ano seria inadequado ou pouco importante mostra, infelizmente, que ainda não chegamos a um respeito unânime aos direitos das mulheres. Levando 7 milhões de candidatos e dezenas de milhões de brasileiros a discutir violência e liberdade, o Ministério da Educação contribui para que este assunto seja, sim, priorizado no debate e na ação dos nossos cidadãos. Isso também é educar.

Francisco Soares é presidente do Inep e professor de Universidade Federal de Minas Gerais

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