Sabotagem do governo agravou mortes por Covid-19, diz estudo

Levantamento da Rede de Pesquisa Solidária aponta que o presidente Jair Bolsonaro negligenciou combate ao vírus desde o início do surto no país, em fevereiro. “Desde março, de forma orquestrada, o governo federal adotou medidas para fragilizar as políticas estaduais e municipais voltadas para aumentar o distanciamento físico. Em consequência, hoje o país se encontra em situação de alto risco”, alerta boletim da organização, que reúne mais de 70 pesquisadores. País tem 108.054 mortes por coronavírus e 3.343.925 casos da doença, segundo consórcio de veículos de imprensa

Foto: Genival Fernandez

Cemitério em Recife (PE)

Mantendo o nível alto de óbitos e novas infecções por Covid-19, o Brasil registra, nesta segunda-feira (17), 108.054 mortes e 3.343.925 casos da doença, segundo o consórcio de veículos de imprensa. De modo planejado, o governo federal vem sabotando as estratégias de combate à pandemia do coronavírus desde o início do surto no país, no final de fevereiro. A negligência do presidente Jair Bolsonaro, que transformou o Brasil em pária internacional, agravou a crise e provocou milhares de mortes. A conclusão é da Rede de Pesquisa Solidária, organização que reúne mais de 70 pesquisadores do país, e consta do relatório ‘Políticas Públicas e as Respostas da Sociedade’. Segundo o documento, publicado na sexta-feira (14), o governo não foi apenas omisso no combate à pandemia, como atuou para prejudicar as ações de enfrentamento.

“Desde março, de forma orquestrada, o governo federal adotou medidas para fragilizar as políticas estaduais e municipais voltadas para aumentar o distanciamento físico”, descreve o documento. Outro trecho aponta que as “posições do Presidente da República ignoraram ou reorientaram recomendações técnicas, descontinuaram a atuação do Ministério da Saúde com a substituição de dois ministros, flexibilizaram os serviços essenciais e reduziram até mesmo a obrigatoriedade do uso de máscaras, no mês de julho”.

De acordo com a Rede, o discurso governista de que era necessário salvar a economia foi um equívoco que levou o país a confundir as prioridades.  Ao insistir na reabertura das atividades, assinala a organização, Bolsonaro “ignorou que as perdas na economia seriam menores à medida em que a disseminação do vírus fosse contida mais rapidamente. Ainda segundo a nota, Bolsonaro “colocou a economia contra a saúde e ignorou que a prioridade é a defesa da vida”. Além disso, “ao politizar a reação contra a COVID-19, o governo emitiu sinais contraditórios para a sociedade, estimulou o conflito com governadores e semeou o desencontro de informação”.

O resultado foi catastrófico. O país hoje lidera o ranking mundial de novos óbitos por milhão de habitantes, cerca de 33 mortes. E está atrás em número total de vidas perdidas apenas dos EUA, que registraram mais de 173 mil óbitos em decorrência do surto.

Coordenação

A Rede de Pesquisa Solidária também compara a resposta brasileira à pandemia à atuação de outros países, como a Alemanha, Argentina e Canadá. A conclusão é que a decisão de descentralizar as estratégias de enfrentamento da pandemia no Brasil vai na direção contrária às decisão da maioria dos países. “Salvo no caso de Estados Unidos, as outras federações se destacam pela coordenação das respostas por meio de suas lideranças nacionais, motivadas pela necessidade de coesão nas respostas como forma de convencer a população a atuar em conjunto contra a pandemia”.

De acordo com o documento, além de delegar as responsabilidades aos estados e municípios, nenhuma outra nação trocou ministros da Saúde durante a pandemia. “No caso do Brasil, houve a troca de Ministro de Saúde duas vezes e o atual responsável, o General Eduardo Pazuello, está no cargo há cerca de 90 dias como interino”, aponta a publicação.

Testes

O levantamento também aponta para a prejudicial baixa testagem no país. Os testes em massa são considerados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) um dos mais importantes instrumentos de combate à doença por permitirem o rastreamento do vírus e isolamento de pessoas com suspeita de terem sido infectadas. O Brasil, aponta o relatório, iniciou as testagens de forma fragmentada. “Em consequência, houve demora na ampliação do número de testes realizados em cada estado”, informa o documento.

Apesar da baixa capacidade instalada para realizar testagem em massa nos laboratórios estaduais, aponta a Rede de Pesquisa, a Fiocruz habilitou laboratórios logo no início de março. Mas a testagem, além de insuficiente, “não é informada de modo transparente à sociedade”. Para o grupo de pesquisadores, “a situação só não é pior porque os estados e laboratórios privados investem recursos elevados para aumentar a capacidade de testagem”.

Respeito internacional

O documento ainda ressalta que a péssima condução do país pelo governo durante a crise sanitária contrasta com a atuação de governos anteriores em outros surtos. “No Brasil, o enfrentamento das pandemias mais recentes contou com estratégias claras do governo federal, de modo a orientar o Sistema Único de Saúde (SUS) e coordenar a ação dos estados e municípios”, atesta a Rede no relatório. “Foi assim nos casos da AIDS, do H1N1 e da SARS, que deram crédito ao Brasil no plano internacional. No caso da COVID-19, isso não aconteceu”.

O documento alerta que ainda há tempo para controlar a disseminação da doença evitar mais mortes desnecessárias. A Rede reconhece, no entanto, as dificuldades, dada a opção de Bolsonaro pelo descaso.”O primeiro passo, ainda que difícil, é reposicionar o governo federal de modo a assumir efetivamente a coordenação dos esforços para combater a pandemia”, recomendam os pesquisadores. “O país ganharia em coesão, a qualidade da informação aumentaria, a precisão das orientações facilitaria a conscientização e até mesmo o custo financeiro tenderia a diminuir”, aponta o relatório.

A Rede também recomenda ações específicas como massificação dos testes, aumento de recursos do governo federal para ações de combate e fazer campanhas nacionais de esclarecimento sobre os perigos da pandemia entre outros. Para os pesquisadores da rede, é necessário “interromper declarações de autoridades que minimizam a COVID-19 e tentam, artificialmente, induzir a população que o pior já passou”. Para a Rede, “a sensação falsa de que o país vive um momento de declínio da epidemia encobre a realidade dos números, que apontam um aumento dos óbitos com a manutenção do nível de isolamento atual, que oscila entre 40% a 50%”.

Da Redação

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