Guedes quer reduzir única fonte de renda de 44% da população
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima em 4,5 milhões o número de domicílios no país onde o auxílio emergencial é a única fonte de renda. “Acabando (o auxílio) e não colocando nada no lugar, vamos ter realmente uma redução do poder de compra da população mais pobre muito forte”, alerta o pesquisador Daniel Duque, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Ibre)
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Uma série de estudos podem explicar as oscilações nas pesquisas sobre a popularidade do governo. A pesquisa Datafolha publicada na sexta (14) pelo jornal ‘Folha de S. Paulo’, por exemplo, apontou que o auxílio emergencial é a única fonte de renda para 44% dos brasileiros que o recebem.
A taxa é maior entre quem ganha até dois salários mínimos (53%) e estudou até o ensino fundamental (59%). Entre moradores do Nordeste que recebem o auxílio, os R$ 600 são a única fonte de renda para 52%. O levantamento apontou também que o benefício tem sido usado por mais da metade das pessoas (53%) para comprar comida. Outros 25% disseram que o usam para pagar contas e 16%, despesas de casa.
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima em 4,5 milhões o número de domicílios no país onde o auxílio emergencial é a única fonte de renda. Segundo o instituto, entre maio e junho, o número de residências que dependem exclusivamente do benefício aumentou em um milhão.
Outro levantamento, do pesquisador Daniel Duque, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Ibre), mostrou que em junho, entre os 10% mais pobres, o auxílio emergencial correspondeu a 97,2% de toda a renda domiciliar per capita. Entre os mais de 21 milhões de brasileiros neste grupo, a renda domiciliar com auxílio foi de R$ 271,93. Sem o auxílio, a quantia cairia para R$ 7,15 por pessoa. Entre os 20% mais pobres, o fenômeno se repete: de R$ 151,20 para R$ 376,39.
A partir de dados da Pnad Covid, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Duque constatou que o auxílio emergencial chegou a 80% dos domicílios das duas primeiras faixas de renda e a três quartos dos domicílios da terceira faixa. Ao todo, 29,4 milhões de domicílios receberam apoio em junho. “Isso mostra que há uma dependência da população mais pobre em relação ao benefício”, destaca o pesquisador.
Parcela dessa população ficou sem a renda do trabalho que possuía, em grande parte oriunda de postos informais no comércio e serviços, os mais impactados na pandemia. Dados da Pnad Contínua, do IBGE, mostram que entre abril e junho, mais de 8,9 milhões de pessoas perderam o emprego, na comparação com os três primeiros meses do ano.
Na avaliação do pesquisador, o país necessita pensar em uma transição do benefício, diante de um mercado de trabalho ainda fragilizado. Estudo do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), com base em dados de junho da Pnad Covid, mostrou que, sem o auxílio, 29,8% dos brasileiros entrariam na pobreza. “Acabando (o auxílio) e não colocando nada no lugar, vamos ter realmente uma redução do poder de compra da população mais pobre muito forte”, alerta.
Outro estudo do FGV/Ibre, também baseado em dados do IBGE, concluiu que o auxílio emergencial fez com que o número de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza caísse de 4,2% para 3,3%, entre maio e junho deste ano. Nas regiões Norte e Nordeste, a renda aumentou 11,7%.
Já o Centro de Estudos em Microfinanças e Inclusão Financeira da FGV concluiu que as pessoas que recebem o auxílio emergencial tiveram seus rendimentos aumentados em 24% em relação ao que recebiam usualmente antes da pandemia. O impacto é maior no caso dos empregados informais, cuja elevação de renda chegou a 50%.
“Para aqueles que receberam o auxílio emergencial, o acréscimo de renda mais do que compensou, pelo menos até o momento, as perdas de renda derivadas da crise. Isso não significa que o auxílio emergencial seja excessivo, mas sim que o nível de pobreza e desigualdade do Brasil é muito alto”, destaca o texto do estudo.
Em julho, pesquisa do Centro de Estudos em Finanças da Escola de Administração de Empresas da FGV mostrou que 63,93% dos entrevistados disseram ter tido perdas na renda em função da crise. Entre eles, a maioria, quase 40%, perderam entre 10% e 30% dos seus rendimentos. Já 2,61% relataram que perderam toda a renda.
A pesquisa mostrou que os mais pobres foram os mais prejudicados. Entre os que perderam toda a renda, os mais pobres correspondem a 15%. Para os entrevistados que tiveram sua renda diminuída entre 51% e 70%, novamente 15% eram os mais pobres.
O estudo também constatou que a crise teve um grande impacto nos investimentos. Houve resgate de investimentos nesse período para 42% dos entrevistados. Sobre o tipo de investimento resgatado, quase 60% dos respondentes resgataram recursos da caderneta de poupança, seguido por 15% que resgataram de fundos de renda fixa e DI, 12% de CDBs, LCI e LCA e 8% de ações.
O estudo indica ainda que a maioria dos entrevistados resgatou até 50% do que tinha investido, enquanto 15% deles resgataram a totalidade ou quase a totalidade. O principal motivo do resgate para 60% dos entrevistados foi cobrir despesas por conta da perda de receita. Em segundo lugar, 21% indicaram ajuda financeira a familiares como o motivo para o resgate. Talvez esteja aí a origem do desgaste de Bolsonaro com as classes médias urbanas.
Da Redação