Nos EUA, militares pedem desculpas; no Brasil, reforçam ameaças

Maior autoridade militar dos EUA, o chefe do Estado Maior, general Mark Milley, pediu desculpas por envolver as Forças Armadas “na politica interna” do país. Em entrevista à revista Veja, o general Luiz Eduardo Ramos reforça as ameças à oposição dizendo que “o outro lado tem de entender também o seguinte: não estica a corda”. “O que é esticar a corda general?”, questionou a presidenta do PT, Gleisi Hoffmann (PR). “Investigar os crimes praticados pelo presidente que tutelam?”, perguntou

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Trump em caminhada publicitária em Washington.

O ministro chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, reafirmou a aparente política de “sinais trocados” do governo Bolsonaro sobre a ameaça de golpe, em entrevista à revista Veja, nesta sexta-feira. “É ultrajante e ofensivo dizer que as Forças Armadas, em particular o Exército, vão dar golpe, que as Forças Armadas vão quebrar o regime democrático”, afirmou. Ao mesmo tempo, no entanto, Ramos fez ameaças à oposição, dizendo que “o outro lado tem de entender também o seguinte: não estica a corda”.

“O que é esticar a corda general?”, questionou a presidente do Partido dos Trabalhadores, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), em seu perfil no Twitter. “Investigar os crimes praticados pelo presidente que tutelam?”, perguntou. Ou, também segundo Gleisi, “julgar as ações de crimes eleitorais praticados pela chapa Bolsonaro/Mourão?”. Ou, ainda, “abrir um dos mais de 30 processos de impeachment que estão na Câmara?”. Para a presidenta do PT, “isso chama-se ameaça”. A isso, somam-se a sabotagem ao combate da pandemia, que já resultou na morte de mais 40 mil brasileiros.

“Eu não deveria ter estado lá”

Também nesta sexta-feira, na contramão dos militares brasileiros, a mídia internacional destacou pedido de desculpas do chefe do Estado Maior dos EUA, general Mark Milley, por envolver as Forças Armadas “na politica interna” do país. “Eu não deveria ter estado lá”, disse Milley, em um discurso em vídeo que gravou para exibição no início do ano letivo na Universidade Nacional de Defesa. “Minha presença naquele momento e naquele ambiente criou uma percepção de envolvimento dos militares na política interna”, disse.

A manifestação da maior autoridade militar dos EUA vai além da sua participação na caminhada de Trump até igreja próxima à Casa Branca para produzir imagem de propaganda às suas bases radicais. “Como oficial da ativa uniformizado, foi um erro com o qual aprendi”, disse Milley, contrário a repressão militar contra a sua própria população. “Devemos defender o princípio de um Exército apolítico que está tão profundamente enraizado na própria essência de nossa república”, disse ele. “Isso leva tempo, trabalho e esforço, mas pode ser a mais importante coisa que cada um de nós faz a cada dia”, completou.

A pressão das manifestações que tomaram às ruas dos Estados Unidos já tinha provocado outras fissuras nas relações entre o presidente Trump e as Forças Armadas do país. Na semana passada, o secretário de Defesa, Mark T. Esper, anunciou que também se opunha a invocar enviar militares para reprimir protestos no país. Nesta semana, Esper e Milley comunicaram através de seus porta-vozes de que estavam abertos a rever os nomes das 10 bases militares norte-americanas, batizadas por generais confederados, defensores de políticas escravistas.

Em defesa de sua posição, o general Ramos ressaltou que “o próprio presidente nunca pregou o golpe”, afirmação desmentida pela postura recorrente de Bolsonaro. Foto: Marcos Correa/PR.

Desserviço ao país

Em defesa de sua posição, o general Ramos ressaltou que “o próprio presidente nunca pregou o golpe”, afirmação desmentida pela postura recorrente de Bolsonaro. Em 19 de abril, o presidente participou de manifestação diante um quartel do Exército em Brasília, onde manifestantes pedem intervenção militar, o fechamento do Congresso e do STF. Na ocasião, Bolsonaro defendeu “fazer tudo que for necessário”, reafirmando as propostas dos ativistas bolsonaristas que pedem adoção de medidas extremas no país.

Em nova manifestação pública, no último dia 24 de maio, Bolsonaro retomou sua pregação voltada para mobilizar as Forças Armadas contra o povo. Em live transmitida pelo perfil oficial nas redes sociais, Bolsonaro afirmou que o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, sabe “fazer valer as Forças Armadas”. “Nos momentos que a nação precisa, ele sabe como fazer valer as Forças Armadas em defesa da democracia e da liberdade”, afirmou o presidente.

Único militar da ativa no governo, Ramos admite que sofreu críticas por ter participado ao lado de Bolsonaro de manifestação que pedia o fechamento do STF e do Congresso. Ramos diz que foi muito criticado “inclusive pelos meus companheiros de farda”, admitindo que pensa abandonar a ativa. “Devo pedir para ir para a reserva. Estou tomando essa decisão porque acredito que o governo deu certo e vai dar certo”, diz. “O meu coração e o sentimento querem que eu esteja aqui com o presidente”, reafirma.

“Acho que os militares que servem o Bolsonaro estão prestando um desserviço ao país”, afirmou o ex-ministro da Educação Fernando Haddad, em referência aos generais e oficiais da reserva que ocupam cargos na Esplanada dos Ministérios. Em entrevista ao portal UOL, na quarta-feira, 10, Haddad, no entanto, afirmou ser contra a crítica generalizada os militares. “Sou contra criticar as Forças Armadas pela conduta dos ministros militares do Bolsonaro. Não podemos cometer esse erro que foi cometido contra outras instituições. Não pode se cometer com as Forças Armadas”, destacou.

“Partido do Exército”

O processo de militarização do atual governo é anterior ao processo de impeachment, em 2016, que contou com a participação ativa de setores militares. Em maio de 2016, a mídia divulgou áudios de conversas entre os personagens que tramavam o golpe de Estado, que resultou no impeachment da presidenta Dilma Rousseff. “Estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranquilo, os caras dizem que vão garantir”, disse Romero Jucá ao seu interlocutor, o ex-peessedebista e, na época, no PMDB, Sérgio Machado.

Novamente, em 3 de abril de 2018, os militares brasileiros tiveram papel fundamental para alterar o processo democrático no país. Nesse dia, o general Villas Bôas, então comandante das FFAA, publicou dois posts no Twitter, com exposição no Jornal Nacional, ameaçando os ministros do STF. O alvo era o ex-presidente Lula e o objetivo impedir a sua participação nas eleições presidenciais daquele ano. Em 2 de janeiro de 2019, durante a cerimônia de transmissão de cargo no Ministério da Defesa, Bolsonaro agradeceu publicamente ao general Villas Bôas, por sua eleição.

General Mark Milley: “Como líder, tudo o que você fizer será acompanhado de perto, e eu não sou imune. Como muitos de vocês viram, o resultado da minha fotografia na Praça Lafayette na semana passada provocou um debate nacional sobre o papel dos militares na sociedade civil. Eu não deveria estar lá. Minha presença naquele momento e naquele ambiente criou uma percepção de que militares poderiam estar envolvidos na política doméstica. Como oficial comissionado, foi um erro, com o qual aprendi e espero sinceramente que todos possamos aprender. Nós, que vestimos a farda de nossa nação, viemos do povo de nossa nação, e devemos defender o princípio de um exército apolítico, que está tão profundamente enraizado na própria essência de nossa República”.

 

 

 

 

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