Bares e praias cheios podem aumentar contaminações e agravar pandemia

Com registro de 1,6 milhão de casos e 65 mil mortos por Covid-19 no país, capitais como o Rio de Janeiro têm novas aglomerações, com milhares de pessoas sem máscara e sem respeitar distanciamento. Liderando marcha da insensatez no país, o presidente negacionista Jair Bolsonaro determinou que presídios e unidades de cumprimento de medidas socioeducativas estão desobrigados do uso de máscara, apesar dos alertas da comunidade científica sobre a letalidade do vírus

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Bares do Rio de Janeiro lotaram neste fim de semana, apesar dos mais de 65 mil mortos por Covid-19 no país

Em meio à escalada da pandemia do coronavírus, o Brasil assistiu, estarrecido, a população do Rio de Janeiro lotar bares e praias da cidade no fim de semana. Enquanto isso, foram registrados 1.613.351 casos da doença e 65.120 mortos, de acordo com o balanço do consórcio formado por veículos de imprensa, divulgado nesta segunda-feira (6).

Liderando a marcha da insensatez no país, o presidente negacionista Jair Bolsonaro decidiu aumentar a lista de vetos à lei que determina a utilização de máscaras de proteção ao coronavírus. Nesta segunda, Bolsonaro determinou que presídios e unidades de cumprimento de medidas socioeducativas estão desobrigados de obedecer a medida de proteção. Ele já havia liberado igrejas, comércio e escolas da obrigatoriedade da utilização de máscaras.

Parte numerosa da população do Rio parece concordar com a roleta russa de Bolsonaro. Apesar de o governo fluminense confirmar mais de 121 mil infectados e 10,6 mil mortos, milhares de pessoas foram vistas nas ruas, sem máscara e sem respeitar o distanciamento social. Um fiscal da Vigilância Sanitária chegou a sofrer intimidações por parte de frequentadores de um bar da zona sul.

“As pessoas foram extremamente agressivas, foram arredias, mais uma vez nossa equipe foi ameaçada”, denunciou o superintendente de Educação e Projetos da Vigilância Sanitária do Rio de Janeiro, Flávio Graça. Reportagem da TV Globo mostrou um casal carioca hostilizando o servidor durante ação da Vigilância. “A gente paga você, filho. O seu salário sai do meu bolso”, disse uma mulher, ao lado de um homem, os dois sem máscara.

Os dois agressores foram identificados como bolsonaristas pelo ‘Diário do Centro do Mundo’ nesta segunda-feira. Nívea del Maestro e seu marido, Leonardo Barros, apagaram os perfis das redes sociais depois da exibição da agressão. Ela também foi demitida da empresa onde trabalhava.

“As pessoas começaram a proferir palavras agressivas, xingamentos, palavras de baixo calão. Aí pegaram o celulares e colocaram apontando diretamente para o rosto dos fiscais, a cinco ou dez centímetros do rosto. Não era uma filmagem, era uma forma de agressão”, explicou o agente sanitário em depoimento ao ‘G1’.

O estado de São Paulo também programou a reabertura de bares e restaurantes para esta segunda, além de cinemas. “Abrir shoppings já é ruim, mas agora os ambientes que serão abertos são particularmente os de alta transmissão, porque as pessoas vão ficar conversando, sem máscara, próximas umas das outras”, avalia a física e pesquisadora da Universidade de Bristol, a Inglaterra, Patrícia Magalhães, em entrevista ao diário ‘El País’. “Em vários lugares do mundo, os parques foram os primeiros lugares que as pessoas puderam ocupar. Aqui não. Como shopping abre antes do que parque?”

Transmissão aérea

Do ponto de vista científico, a estratégia de Bolsonaro de investir irresponsavelmente contra o uso de máscaras mostra-se cada vez mais perigosa e letal. Um grupo de 239 cientistas de 32 países publicou uma carta aberta advertindo para o perigo da transmissão aérea da Covid-19. Na carta, o grupo afirma que a “transmissão aérea parece ser a única explicação plausível para vários eventos de superespalhadores que ocorreram sob tais condições [ em ambientes fechados] e outros onde as recomendações relacionadas à transmissão direta de gotículas foram seguidas”. Os cientistas sustentam que as partículas podem ficar no ar, suspensas, permitindo a transmissão, especialmente em ambientes fechados.

Segundo o jornal ‘The New York Times’ o grupo de cientistas pediu à Organização Mundial de Saúde (OMS) que revise as orientações sobre a transmissão do vírus. “Estamos cientes do artigo e revisando seu conteúdo com nossos especialistas técnicos”, afirmou Tarik Jasarevic, porta-voz da OMS, em uma resposta por email à agência Reuters, que havia pedido esclarecimentos à entidade nesta segunda-feira.

“A lavagem das mãos e o distanciamento social são apropriados, mas, a nosso ver, insuficientes para fornecer proteção contra micropartículas respiratórias portadoras de vírus, liberadas no ar por pessoas infectadas. O problema é especialmente pior em ambientes fechados, particularmente aqueles que estão lotados e com ventilação inadequada em relação ao número de ocupantes, e em períodos de exposição prolongados”, defendem os cientistas na carta.

Imunidade de rebanho

Outra teoria que parece agradar a Bolsonaro, a da imunidade por rebanho, segundo a qual o vírus desaparecia naturalmente depois de infectar cerca de 70% da população, também sofreu fortes abalos nesta segunda-feira. Um estudo realizado na Espanha concluiu que apenas 5% da população desenvolveu anticorpos contra a Covid-19. De acordo com o levantamento, feito em larga escala em território espanhol com 61 mil participantes, a tese da imunidade de rebanho passou a ser considerada impossível. A conclusão foi anunciada pelo Centro Europeu de Controle de Doenças à rede ‘CNN’. O estudo foi publicado na prestigiada publicação científica ‘Lancet’.

“À luz dessas descobertas, qualquer abordagem proposta para alcançar a imunidade do rebanho através de infecções naturais não é apenas altamente antiética, mas também inatingível”, afirmaram os autores Isabella Eckerle, chefe do Centro de Doenças Virais Emergentes de Genebra, e Benjamin Meyer, virologista da Universidade de Genebra.

Segundo os cientistas, ainda não é possível afirmar que possuir anticorpos garante imunidade para novas infecções. “A soroprevalência relativamente baixa observada no contexto de uma epidemia intensa na Espanha pode servir de referência para outros países. Atualmente, a imunidade do rebanho é difícil de alcançar sem aceitar o dano colateral de muitas mortes na população suscetível e sobrecarregar os sistemas de saúde”, conclui o texto do estudo.

OMS abandona testes com cloroquina

Outro revés para Bolsonaro diz respeito ao uso da hidroxicloroquina, defendida pelo presidente para uso no combate à doença mesmo sem comprovação científica de sua eficácia. A OMS anunciou que abandonou definitivamente os testes com a substância. “Os pesquisadores dos testes interromperão os ensaios com efeito imediato”, afirma comunicado da organização.

“O Comitê Diretor Internacional formulou a recomendação à luz das evidências para hidroxicloroquina e para lopinavir/ritonavir e de uma revisão das evidências de todos os estudos apresentados na Cúpula da OMS sobre pesquisa e inovação covid-19 de 1-2 de julho”, observou a agência da ONU.

“Esses resultados de ensaios interinos mostram que a hidroxicloroquina e o lopinavir/ritonavir produzem pouca ou nenhuma redução na mortalidade de pacientes internados na covid-19 quando comparados ao padrão de atendimento”, conclui a OMS.

O anúncio ocorre dois dias depois de Bolsonaro fazer uma defesa do uso preventivo do medicamento. Em Santa Catarina, no sábado, Bolsonaro havia dito que “a única prevenção no momento, o único tratamento é a hidroxicloroquina”.

Da Redação

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